Heterogeneidade institucional de cada país é um entrave à proteção do mercado imobiliário europeu, aponta economista.
Comentários: 0
Boom imobiliário
Christine Lagarde, presidente do BCE flickr_commons

O Banco Central Europeu (BCE) está empenhado em combater a inflação que se faz sentir na Zona Euro - que atingiu os 8,1% em maio, de acordo com os dados mais recentes do Eurostat. E uma das medidas que vai implementar já em julho passa por subir a taxa de juro diretora pela primeira vez em 11 anos. Mas as suas armas para combater a inflação que se faz sentir no mercado imobiliário europeu parecem ser insuficientes devido à heterogeneidade institucional de cada estado-membro, refere o economista John Muellbauer num estudo publicado a propósito do fórum do BCE, que decorreu entre 27 e 29 de junho em Sintra.

As políticas macroprudenciais do BCE têm sido importantes na orientação dos mercados de crédito habitação europeus. Até porque “um período de condições de crédito facilitadas (...) tende a criar vulnerabilidade financeira entre os mutuários e potencialmente entre credores, especialmente se for seguido por uma desaceleração económica”, alerta John Muellbauer, no estudo intitulado “Real estate booms and busts: Implications for monetary and macroprudential policy in Europe”.

Esta vulnerabilidade financeira ocorre quando, por exemplo, as taxas de juro dos créditos habitação de taxa variável começam a subir à boleia do aumento da Euribor – algo que já está a acontecer atualmente. Enfrenta-se, então, o risco de incumprimento dos empréstimos bancários e, caso os non-performing loans (NPLs) aumentem vão reduzir a “capacidade e disposição dos bancos para conceder crédito, resultando em condições de crédito mais apertadas que amplificam a desaceleração da economia”, refere o economista no relatório.

Sobre este ponto, o Banco de Portugal (BdP) rejeitou a perspetiva de um aumento significativo do incumprimento no crédito habitação em Portugal. Já os bancos portugueses admitem que poderá a haver um aumento do crédito malparado no país, até porque a grande maioria dos créditos habitação em Portugal têm taxa variável. Mas sublinham que, hoje, o perfil dos mutuários é mais robusto, pelo que o aumento não deverá ser significativo no país.

Subida dos preços das casas
John Muellbauer, professor da Universidade de Oxford flickr_commons

Como o BCE pode travar o boom imobiliário?

Quando as condições do crédito habitação são mais apetecíveis também “incentiva” a compra de casas pelas famílias, um fluxo que também contribui para o aumento dos preços das casas nos países europeus, a par da baixa oferta de imóveis e da procura de casa por não residentes. E é este cenário que frequentemente precede as crises financeiras.

“É claro que esses booms imobiliários não ocorrem apenas por causa das taxas de juros mais baixas, mas também por causa da liberalização financeira que leva a empréstimos com padrões mais leves. Quando esses booms terminam numa crise financeira, o efeito negativo da facilitação da política monetária pode ser grande”, conclui o economista.

Mas, nesta matéria, o BCE está a “remar contra a maré” para proteger a estabilidade financeira da Zona Euro, porque heterogeneidade institucional entre países “limita” o regulador europeu liderado por Christine Lagarde, refere John Muellbauer, sublinhando que “a eficácia de recentes políticas macroprudenciais na redução de vulnerabilidades relacionadas ao setor imobiliário é avaliada num contexto de heterogeneidade institucional dos países”.

A verdade é que vários países europeus mostram evidencias de sobrevalorização dos preços das casas, sendo um deles Portugal. Tal como apontou o BdP, o mercado residencial nacional dá sinais de sobrevalorização desde 2018, um cenário que se tem vindo a gravar nos últimos anos. Em Portugal, os preços das casas aumentaram 11,5% e 11,6% no terceiro e quarto trimestres de 2021 face ao período homólogo. E no primeiro trimestre de 2022 subiram 12,9%, sendo este o maior aumento desde que há registos contabilizados pelo INE (2010).

“Continuam a existir sinais de sobrevalorização do imobiliário residencial (…) E as vulnerabilidades neste mercado tendem a estar associadas a fatores de médio prazo, podendo demorar algum tempo a traduzir-se numa correção de preços”, disse o regulador português liderado por Mário Centeno no Relatório de Estabilidade Financeira, publicado a semana passada.

Ou seja, se a subida da taxa de juro pelo BCE aumentar ainda mais as taxas Euribor, as famílias vão sentir o impacto nas suas prestações mensais e muitas poderão ficar em risco de incumprimento, perdendo os seus imóveis hipotecados. E este aumento dos juros pode travar também a compra de casas com recurso ao crédito habitação, uma vez que ficam mais caros. A consequência deste comportamento do mercado poderá passar mesmo pelo ajuste dos preços das casas em baixa.

Ver comentários (0) / Comentar

Para poder comentar deves entrar na tua conta