Marta Lourenço, responsável do departamento de avaliações da JLL Portugal, analisa as tendências de mercado e o futuro do setor.
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preços das casas em Portugal
JLL e Freepik

Primeiro a pandemia, e agora a guerra. O cenário geopolítico alterou-se, a inflação disparou e a anunciada subida das taxas de juro está para breve. Fazer previsões é difícil, mas, para já, ainda não se nota o impacto desta conjuntura no mercado imobiliário, segundo Marta Lourenço, Head of Solutions do Cluster Sul-europeu e Valuation Advisory da JLL Portugal. A responsável garante que “os preços dos imóveis continuam a ser bastante competitivos no panorama global”, com o stock de oferta ainda insuficiente para dar resposta à procura. O ritmo de subida no segmento residencial deverá, por isso, continuar, sobretudo nas zonas limítrofes da Grande Lisboa, como Oeiras, Margem Sul, Odivelas, Amadora, e outras junto à cidade do Porto. Ainda assim, frisa, é “importante ver como vão evoluir as taxas de juro daqui para a frente, bem como os custos de construção”.

“Para já, não temos notado o impacto destas questões [inflação e subida dos juros], quer no apetite dos investidores por ativos imobiliários, quer no preço das transações que aconteceram recentemente e que estão a ser fechadas no mercado”, indica a responsável em entrevista ao idealista/news. O mercado está “bastante dinâmico”, analisa, garantindo que não se notam “quaisquer efeitos ou pressão na procura”.

Neste momento, adianta, para alguns segmentos de mercado o 'pricing' dos ativos já voltou a níveis de pré-pandemia e até já supera esses níveis. Ainda que o produto ‘core’ seja o mais apetecível, nomeadamente boa localização, bons inquilinos, bons contratos, a “elevada liquidez disponível e que tem que ser alocada e a referida escassez de produto estão a levar os investidores a tomar estratégias ‘mais exóticas’ para encontrar soluções de investimento, pelo que temos visto muitos a recorrer a promoção de ativos como logística, escritórios, habitação, residências de estudantes e senior living”.

investimento imobiliário
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No caso dos ativos residenciais, Marta Lourenço acredita que “a subida das taxas de juro terá imediatamente repercussões no acesso ao crédito habitação.” “Este facto poderá limitar a procura por produto residencial, uma vez que uma fatia de compradores acede a financiamento para comprar casa. Essa limitação da procura poderá fazer com que os preços possam vir a sofrer algumas oscilações”, explica. Ainda assim, para já, o mercado mantém-se dinâmico e estável.

Afinal, o que é que valoriza e desvaloriza um imóvel? Quais são os principais desafios e exigências associados à avaliação de portefólios de imóveis nos dias de hoje? Como é que se estão a comportar as diferentes classes de ativos? Marta Lourenço responde a estas e outras questões numa entrevista ao idealista/news que agora reproduzimos na íntegra.

É líder do departamento de Avaliações em Portugal, e agora também de Itália e Espanha. Como é que descreveria o comportamento e crescimento desta área em cada país? 

A nível de cluster, sou líder de uma parte específica da atividade de avaliações que é a avaliação de grandes portfólios/carteiras de imóveis, utilizando soluções tecnológicas e de data base (daí portfolio solutions) que maximizem valor para o nosso cliente. É uma área que abrange essencialmente o 'underwriting' de grandes carteiras que são colocadas no mercado e que normalmente são vendidas por bancos/instituições financeiras e que abrangem, usualmente, os chamados 'distressed assets', 'non performing loans' (NPL's) e 'real estate owned assets (REO's)'. Nessa área, o comportamento e crescimento em cada país tem sido em alturas e em ritmos diferentes.

Espanha foi o primeiro a arrancar com esta atividade, essencialmente por ser um mercado mais maduro e onde houve logo uma grande pressão por parte das entidades governamentais para os bancos “limparem” o balanço e cumprirem os rácios de crédito mal parado exigidos pelo BCE depois da crise económico-financeira. Foi mais ou menos em 2015 que se iniciaram estas grandes operações em Espanha e onde a JLL se posicionou logo como líder de mercado, com a criação de uma plataforma de raiz para fazer a avaliação destes grandes volumes de forma automática (AVM's) e com informação/data que tínhamos e temos in-house, assim como informação externa (comparáveis, dados sócio-económicos, etc). Tivemos um ritmo alucinante logo de início, onde nos posicionamos muito bem nas grandes operações, com uma cobertura de quase 100% de todas as carteiras que vieram para o mercado.

Portugal foi o segundo país a arrancar. Começámos em 2017 de forma mais intensiva e tivemos em 2018, 2019 e no primeiro trimestre de 2020 verdadeiros anos dourados desta atividade, onde trabalhámos em 100% de todas as transações no mercado, para 'sell side e buy side', e onde nos posicionámos como líderes de mercado.

Já em Itália o ritmo foi um pouco diferente, dado as especificidades do mercado em si, onde a transparência é menor e o ritmo de vendas também é diferente, sendo que no momento presente é o país que apresenta mais oportunidades nesta área específica, dado ter começado mais tarde e de ainda ter um rácio de NPL elevado face aquilo que o BCE recomenda.

Estamos agora numa fase duma cadência mais regular de carteiras de NPLs a vir para o mercado

Espanha e Portugal estão já numa fase de menos explosão, uma vez que, nos últimos anos, foram países mais agressivos no 'disposal' destas carteiras. Estamos agora numa fase duma cadência mais regular de carteiras de NPLs a vir para o mercado, ainda com algum 'legacy' do passado, mas também a derivar da atividade normal dos bancos, que têm sempre algumas carteiras para limpar, mas que não são fruto de um choque externo como houve com a crise financeira. Ainda se vai ver o impacto da pandemia no balanço dos bancos, assim como se está a acompanhar de perto a questão da subida das taxas de juro, que tem sempre impacto nos níveis de endividamento de singulares e empresas.

Quais os principais desafios e exigências associados à avaliação de portefólios de imóveis nos dias de hoje? 

Eu poria como primeiro desafio os deadlines/prazos, dado o volume de avaliações que temos que fazer. São sempre prazos muito apertados e por isso temos que ter ferramentas muito agilizadas e equipas muito disciplinadas e conhecedoras e uma boa resistência ao stress .

avaliação de imóveis
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A maior exigência diria que vem essencialmente dos nossos clientes. Estamos a falar de investidores institucionais, muito sofisticados e com competências muito alargadas e que esperam de empresas como a JLL o melhor output possível para operações de grande dimensão, desde as nossas opiniões de valor, até aos comparáveis que apresentamos, conclusões, etc. A acrescer a isto, existe muitas vezes, em determinadas localizações, uma escassez de informação enorme e muito pouca transparência e isso é, por vezes, difícil de explicar, principalmente a clientes que se movimentam, na sua grande maioria, em mercados maduros, onde toda a informação é disponibilizada e está bastante acessível.

Existe muitas vezes, em determinadas localizações, uma escassez de informação enorme e muito pouca transparência

Isto leva-me ao último e grande desafio que gostaria de mencionar, que é o tipo de ativos que encontramos por vezes nestes portfólios, muitos deles muito específicos (unidades fabris, armazéns industriais, etc) e em localizações muito secundárias e remotas, onde o mercado não funciona tão bem e onde simplesmente não existe informação. É muito difícil avaliar ativos muito pouco líquidos e em mercados onde simplesmente não há transações que nos possam indicar um caminho.

Como é que a pandemia afetou a avaliação dos imóveis? 

A pandemia afetou a avaliação dos imóveis essencialmente por haver um congelamento de transações de imóveis e, por essa razão, o avaliador ficou sem comparáveis que evidenciassem para onde se dirigia o valor dos ativos. Houve classes bem mais afetadas que outras, nomeadamente o retalho e a hotelaria, onde ainda hoje, principalmente para centros comerciais, continuamos sem saber exatamente em que níveis estão as yields, principalmente para centros comerciais mais secundários.

Só para terem uma ideia, nos primeiros meses de pandemia, as nossas avaliações estavam sujeitas à cláusula de “material uncertainity”, precisamente por não haver evidências de mercado que sustentassem as nossas opiniões de valor. À medida que o tempo foi passando, e começaram a surgir as primeiras transações durante e no pós-pandemia, esta cláusula foi sendo levantada, uma vez que voltamos a ter comparáveis e evidências de mercado a sustentar as nossas avaliações.

Como é que se comportaram as diferentes classes de ativos? 

Comportaram-se de maneira distinta, efetivamente, e a evolução foi díspar para as diferentes classes de ativos. Numa primeira fase, temos aqueles mais óbvios e cuja desvalorização aconteceu mais rapidamente, como são o retalho, a hotelaria e a promoção imobiliária.

Os primeiros claramente pelo confinamento, com quebras significativas de vendas em todos os setores de atividade (salvo raras exceções como os supermercados, as lojas de eletrónica, farmácias e bricolage) e que levou senhorios a concederem descontos, moratórias de rendas, períodos de carência para uma parte significativa dos inquilinos, com impacto direto no rendimento do ativo. Efetivamente, houve centros comerciais que registaram quebras de venda na ordem dos 30 a 40%. Os segundos pela via do turismo e restrições de viagens, com as taxas de ocupação dos hotéis a chegaram a valores perto de zero nos meses do confinamento. Por último, a promoção imobiliária, pela via da incerteza da evolução futura do mercado e que impacta diretamente os business plan dos promotores, refletindo-se imediatamente no aumento da perceção de risco destes ativos e numa paralisação de negócios.

A logística tem sido dos setores mais “sexys”, com um claro aumento do interesse por parte dos investidores

Do lado contrário, os setores surpresa, como a logística, os alternativos, o residencial e os escritórios. A logística tem sido dos setores mais “sexys”, com um claro aumento do interesse por parte dos investidores, dado o aumento claro das vendas online, contribuindo para que este setor não tenha sofrido qualquer desvalorização em Portugal e tendo mesmo havido aumento de preço, quer pela via das rendas, quer pela via da valorização de capital (yield).

mercado residencial em Portugal
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O setor residencial também tem sido uma surpresa e, de facto, os preços têm-se mantido estáveis e até mesmo registado subidas em algumas localizações. Por último, o setor dos escritórios, que inicialmente revelou alguma inquietação por parte dos investidores, devido ao remote working, mas que entretanto se mostram muito resilientes novamente, especialmente porque o mercado ocupacional volta a demonstrar um bom dinamismo.     

Setores do retalho e hotelaria foram inicialmente os mais afetados.  Já estão a recuperar? 

Foram os mais afetados sim, mas no que se refere à hotelaria já se verificam sinais de recuperação. Estes foram mais tímidos em 2021 (a taxa de ocupação em Lisboa subiu de 21.73% em 2020 para 27.79% em 2021) mas as perspetivas para este ano são grandes e, segundo o que parece, no Algarve, este mês de abril, devido à Páscoa, já esteve a níveis pré-pandemia.

A guerra na Ucrânia poderia ensombrar um pouco este cenário de crescimento, mas o que se perspetiva é que dada a distância geográfica que temos, a nossa atratividade enquanto destino turístico, e o facto de sermos reconhecidos como um destino seguro, num contexto em que a vontade das pessoas em viajar é grande, pode até beneficiar Portugal. A inflação já se faz sentir nos preços dos hotéis, os quais têm vindo a subir preços, mas não acreditamos que possa ter impacto nesta fase, pois ainda assim somos considerados um destino barato (ainda que de qualidade). Do ponto de vista do investimento em hotéis, o interesse mantém-se, sendo Lisboa, Porto e Algarve o principal foco de procura de oportunidades. A escassez de oferta tem vindo a fazer com que as yields se mantenham ao mesmo nível pré-pandemia.

centros comercais
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Do lado do retalho, ao nível da performance de centros comerciais, assistimos de facto a uma recuperação, nomeadamente o aumento das vendas, que foi já registado nos últimos meses do ano de 2021 para shoppings prime. Em 2022 já verificamos também essa mesma recuperação para centros comerciais secundários bons. Contudo, as vendas não estão ainda aos níveis de pré-pandemia. Achamos que essa curva vai ser crescente durante este ano e que nos shoppings prime é expectável termos níveis semelhantes ao ano de 2019 no final de 2022, o que dará confiança acrescida aos investidores para voltar a olhar para este tipo de ativos. Ainda no retalho, mas no lado oposto,  podemos claramente assumir que o retalho alimentar não foi afetado pela pandemia e acabou por ser até premiado. Por fim, temos o comércio de rua ainda a sofrer ligeiramente porque está diretamente relacionado com o setor do turismo. Ainda assim, as rendas e as yields prime das principais zonas turísticas de Lisboa e Porto (Av. Liberdade, Chiado, Rua Augusta e Rua de Santa Catarina) mostram-se bastante resilientes com pequenos ajustes desde a pandemia que serão, com certeza, anulados no curto prazo, pois é essa a indicação que tempos por parte de ocupantes e investidores.

Já o setor residencial revelou-se uma surpresa e os preços continuaram a subir. Como é que se explica esta evolução? O ritmo de subidas vai continuar? 

Razões para esta evolução são muitas, mas destaca-se a necessidade da existência de uma casa, independentemente da conjuntura. No pré-covid, o grande problema do mercado residencial residia em ter capacidade de oferta para a procura existente, situação que se mantem na atualidade. A oferta atual não é suficiente para a procura que temos pelo nosso mercado, quer nacional, quer internacional, o que faz com que os preços continuem a subir, embora a um ritmo diferente do que se viu nos últimos cinco anos antes da pandemia.

Razões para esta evolução são muitas, mas destaca-se a necessidade da existência de uma casa, independentemente da conjuntura

Durante e já no pós-pandemia, o mercado doméstico respondeu muito bem, sendo um dos principais motores do mercado residencial em Portugal. Outras razões que explicam a evolução positiva é a “nova” perceção sobre Portugal no estrangeiro. Os preços dos imóveis continuam a ser bastante competitivos no panorama global, a qualidade da nossa habitação é excelente, as cidades deram um salto invejável de requalificação, temos ótimo clima, qualidade de vida, segurança e boas infraestruturas de saúde e educação.

A da nossa habitação é excelente, as cidades deram um salto invejável de requalificação

Se o ritmo de subida vai continuar acreditamos que sim, embora para outros segmentos do mercado residencial. Não vemos essas subidas no mercado de luxo ou nas zonas mais prime de Lisboa, onde os preços estão já bastante estabilizados, mas em zonas mais limítrofes, como Oeiras, Margem Sul, Odivelas, Amadora e nas zonas limítrofes da cidade do Porto. Será importante ver como vão evoluir as taxas de juro daqui para a frente, bem como os custos de construção.

preço das casas
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Quantos imóveis é que a JLL avaliou no ano passado em Portugal e por quanto? Que tipo de imóveis foram esses?

O ano passado foram avaliados pelo departamento de avaliações da JLL cerca de 2.200 imóveis, num total de 16 mil milhões de euros. Imóveis de todo o tipo, mas essencialmente do setor de imobiliário comercial (hotéis, centros comerciais, plataforma logísticas, edifícios de escritórios), promoção imobiliária e algum residencial, principalmente inserido em portfólios.

O princing dos ativos já voltou aos níveis pré-pandemia? Ou já superou esses valores? 

Para alguns setores o pricing já voltou a níveis de pré-pandemia e até já superam esses níveis. Para outros, nomeadamente retalho, e estamos a falar no caso específico de centros comerciais, ainda não, mas, como já referi anteriormente, espera-se que 2022 seja o ano de recuperação. Os restantes setores apresentam-se bastantes robustos, com industrial & logística, retalho alimentar, alternativos (healthcare, senior living, student housing, etc) a evidenciarem performances melhores do que em pré-pandemia.

As transações que temos vindo a acompanhar no primeiro trimestre do ano evidenciam isso mesmo, uma total recuperação face a 2020 e alguns setores claramente a destacarem-se pelo interesse que os investidores demonstram. Para já, não notamos impacto no mercado imobiliário de questões relacionadas com inflação, a questão da guerra da Ucrânia e a subida das taxas de juro.

Para já, não notamos impacto no mercado imobiliário de questões relacionadas com inflação, a questão da guerra da Ucrânia e a subida das taxas de juro

Como é que a tecnologia está (ou pode estar) ao serviço da avaliação imobiliária? 

A tecnologia é hoje uma ferramenta essencial na avaliação imobiliária. Por todas as razões e mais algumas. Logo para começar, a questão de minimizar erros humanos e permitir a automatização de tarefas mais repetitivas e que roubam imenso tempo ao avaliador quando esse tempo poderia ser melhor canalizado para tarefas onde realmente acrescenta valor, o chamado 'advisory'. A tecnologia permite automatizar relatórios, buscas de comparáveis, criar tabelas automáticas, fazer a própria avaliação. O trabalho do avaliador será depois analisar essa informação, fazer 'sanity checks', incorporar no relatório aquilo que realmente a tecnologia não consegue e que realmente acrescenta valor, nomeadamente a parte mais estratégica, riscos e oportunidades, business plan, etc. Para além disso, a tecnologia permite-nos ser muito mais eficientes e produtivos. Podemos realizar muito mais volume com prazos mais curtos. Por último, e não menos importante, permite armazenar e criar uma base de dados única que podemos usar para prestar outros serviços aos nossos clientes, como prever evolução futura do valor dos ativos, monitorização de portfólios, criação de benchmarks, etc.

tecnologia no imobiliário
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A JLL desenvolveu uma tecnologia que permite fazer AVM's (automatic valuations) de um portefólio de 500 imóveis em apenas um dia. Como é que funciona esta tecnologia?

Esta tecnologia funciona como uma 'machine learning', com base em algoritmos, em que quanto mais avaliações se fazem, mais o algoritmo aprende e afina. Isto significa que a plataforma é alimentada por uma panóplia de informação/data/data points, que vai desde informação externa que nos é disponibilizada (muitas vezes, pública, nomeadamente fontes como INE, portais de imobiliário, Banco de Portugal, etc.), bem como informação interna, a qual e tratada com toda a confidencialidade, e que advém das nossas várias áreas de negócio.

Por exemplo, imaginemos que temos um apartamento para avaliar em Cascais. Com a nossa plataforma Valorem basta colocar a localização do apartamento e a área, carregamos num botão e temos a avaliação feita, com um reporting, com uma seleção automática de comparáveis e com vários indicadores sócio-económicos para aquela freguesia e concelho. Cabe depois ao avaliador apenas validar a avaliação com o seu expertise. O facto de termos esta plataforma à nossa disposição permite-nos ser muito rápidos e eficientes, para além de nos posicionar muito bem em determinados setores de avaliação, como por exemplo a avaliação de grandes portfolios/carteiras de ativos, onde somos líderes de mercado.

O que é que valoriza ou desvaloriza um imóvel? 

Vários fatores e esses fatores variam um pouco se estamos a falar de imobiliário comercial ou imobiliário residencial. De uma forma transversal, diria, desde logo, a localização (zona urbana vs. zona rural, existência ou não de transportes públicos, boas infraestruturas públicas e acessos rodoviários, etc.), estado de conservação do imóvel, níveis de acabamentos/fit-outs, qualidade de construção e eficiência energética (a existência de certificações de ESG). Se estivermos a falar de imobiliário comercial, para além dos aspetos mencionados, acrescentaria a existência de contratos de longa duração, com boas covenants, a existência ou não de desocupação, etc. Do lado dos ativos residenciais, acrescentaria a potencial existência de vistas, existência de amenities, etc. Aliás, esta última tornou-se algo essencial no pós pandemia, assim como a existência de maiores espaços exteriores nas novas casas.

Do lado dos ativos residenciais, acrescentaria a potencial existência de vistas, existência de amenities, etc. Aliás, esta última tornou-se algo essencial no pós pandemia, assim como a existência de maiores espaços exteriores nas novas casas.

De que é que os investidores nacionais e internacionais estão à procura?

Diria que o 'produto core' (boa localização, bons inquilinos, bons contratos) é o produto mais apetecível por ser mais resiliente a momentos de incerteza (tendo em conta os impactos da pandemia que ainda vão estando na memória e o conflito na Ucrânia), mas esse é bastante escasso e manifestamente curto face ao nível de liquidez existente.

residências de estudantes
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Aliás, a elevada liquidez disponível e que tem que ser alocada e a referida escassez de produto estão a levar os investidores a tomar estratégias mais exóticas para encontrar soluções de investimento, pelo que temos visto muitos investidores a recorrer a promoção de ativos como logística, escritórios, habitação, residências de estudantes e senior living, porque o produto acabado no mercado é muito escasso.  A elevada liquidez tem levado também muitos investidores a procurar grandes portfólios, que exigem montantes mais alargados de investimento e onde conseguem alocar mais volume. De facto, os portfólios tem tido também bastante procura.

De que forma é que a inflação e anunciada subida das taxas de juro vai influenciar a avaliação dos imóveis?

Para já, não temos notado o impacto destas questões, quer no apetite dos investidores por ativos imobiliários, quer no preço das transações que aconteceram recentemente e que estão neste momento a ser fechadas no mercado.

De qualquer forma, e em especial nos imóveis de rendimento, tradicionalmente com contratos indexados à inflação, haverá um acréscimo de valor pelo aumento de rendas durante o período inflatório, sendo que isso poderá repercutir-se nas yields que estes possam considerar hoje (yield de entrada) para aquisição dos imóveis e, portanto, haverá um impacto no valor, ainda que achemos que seja muito pouco relevante.

Nos ativos residenciais, a subida das taxas de juro terá imediatamente repercussões no acesso ao crédito

Por outro lado, a subida das taxas de juro, poderá levar a uma subida das yields por força da subida do custo de capital. Nos ativos residenciais, a subida das taxas de juro terá imediatamente repercussões no acesso ao crédito. Este facto poderá limitar a procura por produto residencial, uma vez que uma fatia de compradores acede a financiamento para compra de habitação. Essa limitação da procura poderá fazer com que os preços possam vir a sofrer algumas oscilações.

Poderão exercer pressão sobre a procura? Em que medida? 

Vamos ver. Para já não se notam quaisquer efeitos ou pressão na procura e o mercado esta bastante dinâmico. Se as taxas de juro ou inflação começarem a subir poderá acontecer, principalmente pelo lado do aumento do custo do capital e do aumento do custo endividamento/acesso condicionado a financiamento. Só por aí poderá logo a haver uma pressão da procura, uma vez que o aumento de custo de capital irá conduzir a exigência por parte dos investidores de retornos mais elevados, podendo haver aqui um mismatch de expetativa de preço entre comprador e vendedor, esfriando a procura e adiando transações. Por outro lado, e como já mencionado anteriormente, o aumento do custo de endividamento mais alto por via do aumento das taxas de juro, principalmente no mercado residencial, poderá condicionar a procura, porque grande parte desta necessita de financiamento para aceder a compra de habitação.

Os investidores procuram essencialmente produto core, prime, de qualidade superior, com amenities, eficiência energética, sustentáveis, uma vez que são vistos como muito mais resilientes e líquidos

Esta procura crescente está a afetar a relação entre preço e qualidade em Portugal? 

Diria que não. Como referido anteriormente, os investidores procuram essencialmente produto core, prime, de qualidade superior, com amenities, eficiência energética, sustentáveis, uma vez que são vistos como muito mais resilientes e líquidos. Para alem disso, são players cada vez mais informados e, na grande maioria, muito sofisticados e conhecedores. Sabemos que os ativos com menos qualidade são sempre mais penalizados, portanto, do lado da oferta, é bom que a equação preço/qualidade esteja correta, sob pena de não se conseguir escoar produto, dado os requisitos da procura atual.

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