
Tendo a subida dos preços das casas desacelerado ao longo do ano passado, será que esta tendência irá manter-se em 2024? Como vai o mercado imobiliário, sobretudo o segmento residencial, comportar-se e dar resposta à necessidade de aumentar a oferta de casas para fazer face à crise habitacional? Os desafios são muitos e a vários níveis, nomeadamente políticos – há eleições legislativas agendadas para dia 10 de março –, mas as mediadoras imobiliárias consultadas pelo idealista/news não atiram a toalha ao chão. As principais oportunidades estarão à espreita nas periferias das grandes cidades, onde há empreendimentos a ser desenvolvidos, antecipam.
O que esperar da mediação imobiliária em 2024? Ideias a reter:
- Preços das casas vão estabilizar e vão vender-se mais imóveis? Prudência é palavra de ordem.
- Adeus maioria absoluta? O que poderá o próximo Governo fazer em prol da mediação imobiliária?
- Há oportunidades à espreita na mediação imobiliária? Quais e onde?
- De olhos postos nas periferias das grandes cidades, onde há projetos a nascer.

“Arrefecimento da procura” de casas
“É inegável que as condicionantes impostas, sobretudo, pela conjunta internacional, não permitiram que 2023 fosse um ano de crescimento para o setor, em geral, e para a ERA, em particular. Ainda assim, e uma vez mais, o setor mostrou-se resiliente e prevemos fechar o ano com uma quebra pouca significativa face ao ano de 2022 que foi o melhor da história da empresa. Para 2024 perspetivo, acima de tudo, um ano de correções com ajustes nos preços das casas que continuarão a subir, mas a um ritmo mais moderado. E, naturalmente, fruto do contexto em que vivemos, poderá verificar-se algum arrefecimento da procura sobretudo no primeiro semestre”, começa por dizer Rui Torgal, CEO da ERA Portugal.
Relativamente ao número de transações, o gestor confia que o volume se mantenha semelhante ao de 2023: “Com a estabilização das taxas de juro e até a previsão de decréscimo a partir do segundo semestre, elimina-se um dos fatores que mais contribui para o volume de transações”.
"Para 2024 perspetivo, acima de tudo, um ano de correções com ajustes nos preços das casas que continuarão a subir, mas a um ritmo mais moderado. E, naturalmente, fruto do contexto em que vivemos, poderá verificar-se algum arrefecimento da procura sobretudo no primeiro semestre”
Rui Torgal, CEO da ERA Portugal
Luis Nunes, CEO da ComprarCasa, fala de 2023 como tendo sido “um ano de incorporação e aceitação de um novo paradigma”. Considera que “o futuro não passará por taxas indicadoras negativas e quase de inflação nula” e que a realidade atual, marcada por taxas de juro diretoras elevadas – fizeram disparar as taxas Euribor, que têm impacto direto no valor do crédito habitação –, “fez com que o mercado tenha emagrecido em número de operações e, em menor quantidade, em volume de transações”.
“O preço continua ‘quente’ e com sustentabilidade, assente na mais básica tese económica que conhecemos: a elasticidade do preço. Continuamos, mesmo com reflexos na procura, a ter menos oferta do que a primeira, o que sustenta a estabilidade e, até, incremento dos preços médios das transações”, acrescenta o responsável, perspetivando que “o ano 2024 não será muito diferente” do de 2023 e que o “número de transações irá estabilizar”.
Do lado da Remax Portugal, Beatriz Rubio fala de um ano de 2023 repleto de desafios e diz acreditar que 2024 não será diferente: “As subidas das taxas de juro e da inflação, a quebra da procura e a instabilidade política internacional têm marcado o ano, a que se juntaram, nas últimas semanas [do ano passado], algumas indefinições sobre o rumo das decisões políticas”.
Segundo a CEO da mediadora imobiliária, “para 2024 é expetável a estabilização dos preços e do nível de atividade do setor, atendendo a que, só no primeiro semestre de 2023, se registou uma quebra de mais de 20% na venda de habitações face a igual período de 2022”. E admite que “podemos mesmo pensar num recuo, embora leve, dos preços praticados”.
“Estabilização de preços em 2024”
Para Alfredo Valente, CEO iad Portugal, não há dúvidas de que “o ano de 2023 fica marcado por uma crise de ausência de habitação ajustada às expectativas e às necessidades das famílias, e por uma inversão da tendência de crescimento, tanto em termos de transações como de preços”, que o país vivia “desde a saída da última crise até meio de 2022”.
O especialista considera que o ‘boom’ do mercado imobiliário nos últimos anos ocorreu “sobretudo à custa dos imóveis existentes, com o investimento na reabilitação dos grandes centros urbanos a contribuir significativamente para esse processo”.
“Apesar desse crescimento, o ritmo de construção nunca foi recuperado, levando à escalada de preços”, acrescenta, salientando que, enquanto não houver oferta relevante de construção nova, os preços não tenderão a baixar. “Em 2024, vamos muito possivelmente assistir a uma tendência para a estabilização dos preços, mas sem alterações muito significativas. A procura estrangeira também deverá manter-se relevante, uma vez que Portugal continua a assumir-se como um mercado atrativo para o investimento imobiliário”, analisa.
“Em 2024, vamos muito possivelmente assistir a uma tendência para a estabilização dos preços, mas sem alterações muito significativas. A procura estrangeira também deverá manter-se relevante, uma vez que Portugal continua a assumir-se como um mercado atrativo para o investimento imobiliário"
Alfredo Valente, CEO da iad Portugal
Em jeito de balanço do ano, David Carapinha, CEO da Home Tailors, indica que 2023, em número de transações, “foi em linha com o ano anterior, não existindo um crescimento expressivo, mas não existindo também uma estagnação do setor”.
“Para 2024 esperamos que se reforce a tendência sentida no último trimestre de 2023: maior procura pelas famílias para habitação própria permanente (suportada na estabilização das taxas de juro), o desenvolvimento de mais projetos de nova construção e um consequente ajuste de preço nos imóveis usados, para que se tornem mais competitivos”, prevê.
Sobre o mesmo tema, e quando questionado sobre o que esperar da mediação imobiliária em Portugal em 2024, João Bolou Vieira, CEO do Homing Group, estima que as taxas de juro irão diminuir, o que deverá levar a “uma recuperação do número de transações”. “Mas o aumento só deverá estar normalizado em 2025, [pelo que] o ano de 2024 não será de diminuição, mas de estabilização”.
Relativamente ao ano de 2023, o responsável detalha que houve “uma redução das transações no primeiro trimestre que não se refletiu no preço das casas”. “Sabemos que a procura em 2023 diminuiu face a 2022, cerca de 20% no mercado em geral, o que não afetou os preços. [Já] no mercado de arrendamento, o valor das rendas registou um aumento substancial em 2023. O número de transações vai-se manter, mas tem potencial para crescer”, conclui.

Está a demorar-se mais tempo a fechar uma transação?
A esta pergunta, os responsáveis das mediadoras imobiliárias auscultados pelo idealista/news respondem de forma clara.
“Apesar de se perspetivar que a procura continuará significativamente superior à oferta, é natural que o tempo médio de venda aumente em 2024 sobretudo porque os critérios de avaliação de risco adotados pelos bancos se tornarão mais rígidos. Com isto não quero dizer que não se irão vender casas, apenas que o processo se poderá tornar ligeiramente mais demorado”, aponta Rui Torgal.
“No que se refere ao tempo para fechar uma transação, é inegável que os imóveis cujos valores foram já ajustados à nova realidade do mercado são transacionados mais rapidamente. Por outro lado, em conjunturas mais difíceis, os proprietários têm mais dificuldade em vender os imóveis, pelo que o tempo médio para fechar uma transação variará ainda mais se se tratar de uma venda mediada ou não”, comenta Beatriz Rubio.
Alfredo Valente considera que se assistiu, na segunda metade do ano passado, a “uma inversão” no que diz respeito ao tempo médio de vendas, “com uma tendência de aumento do período que decorre entre a colocação do imóvel no mercado e a conclusão da transação”.
Já Luís Nunes frisa que o aspeto que mais tem afetado a dinâmica da mediação imobiliária está relacionado com o crédito habitação, “seja por via das atuais condições financeiras (diretamente relacionadas com as taxas de juro), seja pelos critérios de aprovação”. “Estas duas razões, estão na base do incremento do tempo médio de contratação”, sublinha.

Novo Governo à vista. O que muda na mediação imobiliária?
O final do ano de 2023 ficou marcado pela novidade das eleições legislativas antecipadas – estão agendadas para dia 10 de março de 2024 –, na sequência do inesperado pedido de demissão de António Costa do cargo de primeiro-ministro, depois de saber que estava envolvido numa investigação judicial. Uma notícia que apanhou tudo e todos de surpresa e que contribuiu para aumentar a instabilidade no país, sendo este um termo que os vários players do setor querem ver pelas costas. Será então que o facto de o país ir às urnas é algo positivo para o imobiliário? Eis o que dizem os responsáveis das mediadoras imobiliárias.
“O facto de o país ir a eleições em março não impacta diretamente o setor imobiliário. Considero que cada vez mais as questões políticas do país estão distantes das questões financeiras, sobretudo porque as principais diretrizes são europeias e não locais. O que teria realmente impacto no setor seria a criação de incentivos diretos à construção que permitissem corrigir a falta de casas disponíveis que temos no mercado”, defende Rui Torgal, CEO da ERA.
"A posse de novo Governo poderá ser positiva, no sentido em que o clima de incerteza atual se traduz em baixa confiança no mercado. Ao surgir um caminho claro (novo ou de continuação), será possível reconquistar a confiança do mercado. O investimento imobiliário continuará a ser um dos seguros"
David Carapinha, CEO da Home Tailors
Por outro lado, David Carapinha, CEO da Home Tailors, entende que “a posse de novo Governo poderá ser positiva, no sentido em que o clima de incerteza atual se traduz em baixa confiança no mercado. Ao surgir um caminho claro (novo ou de continuação), será possível reconquistar a confiança do mercado. O investimento imobiliário continuará a ser um dos seguros”.
Já para Alfredo Valente, “a mudança de Governo, especialmente nos contornos em que está a decorrer, acrescenta uma camada adicional de incerteza a um cenário já de si desafiante, tanto a nível nacional como internacional”.
“As medidas aprovadas no programa Mais Habitação, bem como o fim do incentivo fiscal aos Residentes Não Habituais (RNH), não dão resposta às necessidades dos portugueses em matéria de habitação, nem permitem alcançar o objetivo prioritário de trazer ao mercado mais casas, com preços ajustados à real capacidade das famílias. A solução para mitigar a divergência entre a elevada procura e a falta de oferta passará, em grande parte, pela implementação de medidas que venham agilizar e incentivar a nova construção. O Simplex do Licenciamento Urbanístico, por exemplo, já é um passo importante nesse sentido”, acrescenta o CEO iad Portugal.

Viver no reino da instabilidade e da incerteza
Uma opinião, de resto, partilhada pelos restantes players ouvidos pelo idealista/news. “O imobiliário em Portugal enfrenta um conjunto de problemas que são já estruturais, como o enorme desfasamento entre a oferta e a procura, o atraso e rigidez do processo de licenciamento, a elevada carga fiscal e um mercado de arrendamento pouco competitivo. Se a estes problemas juntarmos as dificuldades conjunturais como a instabilidade política, o encarecimento da construção nova, a subida da inflação e das taxas de juro, temos algo muitíssimo complexo só solucionável com uma concertação política que promova a sustentabilidade de medidas corretivas a longo prazo”, destaca Beatriz Rubio.
Segundo a CEO da Remax Portugal, “um novo Governo acarreta sempre alguma ansiedade e incerteza sobre o que irá acontecer, mas o estado em que o imobiliário se encontra em Portugal exigirá, acima de tudo, uma concertação político-partidária que resolva os problemas de longo prazo de forma sustentável e não medidas pontuais e curtas no tempo”.
"O contexto atual de escalada dos preços e as medidas do Governo afetaram a procura. O foco é a falta de casas. Entre a fase de licenciamento até à fase de construção o processo pode demorar seis anos, dos quais três só para aprovação do projeto. Faltam políticas do lado da oferta que não estão a funcionar. Esta instabilidade está a afetar o mercado"
João Bolou Vieira, CEO do Homing Group
João Bolou Vieira, CEO do Homing Group, em resposta à pergunta se são boas ou más notícias Portugal ter um novo Governo, diz que tudo “dependerá do resultado das eleições”. “O contexto atual de escalada dos preços e as medidas do Governo afetaram a procura. O foco é a falta de casas. Entre a fase de licenciamento até à fase de construção o processo pode demorar seis anos, dos quais três só para aprovação do projeto. Faltam políticas do lado da oferta que não estão a funcionar. Esta instabilidade está a afetar o mercado”, avisa.
Também Luis Nunes frisa que “as instabilidades políticas nunca são bem-vindas”, criando “sempre desconfiança nos mercados e alguma instabilidade”. De acordo com o CEO da ComprarCasa, o polémico pacote do Governo Mais habitação “peca por não incluir um claro programa de criação de novas habitações ou um verdadeiro programa de reabilitação das mais de 700 mil unidades devolutas que regista o mercado”. “Este programa deveria assentar numa real intervenção do poder central como dínamo e catalisador do interesse privado na aposta de nova produção imobiliária”, justifica.
Que oportunidades e riscos há na mediação imobiliária?
“No atual contexto, em claro contraponto com a anterior crise que vivemos ('subprime' e intervenção da troika), a banca está muito mais sólida financeiramente”, responde Luis Nunes, deixando algumas dúvidas no ar. “O risco surgirá daqui por dois anos. Como estará o mercado financeiro? Quais as taxas nessa altura?”. A verdade é que, segundo o especialista, “do risco de alguns, como sempre, surgem oportunidades para outros”.
“Além disso, acreditamos que o que hoje vivemos acelerará o reposicionamento familiar no imóvel que, efetivamente, necessitam para o seu agregado, colocando no mercado imóveis com tipologias acima do necessário para procurar outros com a tipologia necessária. E esta realidade trará novas dinâmicas imobiliárias e novas oportunidades”, conclui.
"Acreditamos que o que hoje vivemos acelerará o reposicionamento familiar no imóvel que, efetivamente, necessitam para o seu agregado, colocando no mercado imóveis com tipologias acima do necessário para procurar outros com a tipologia necessária. E esta realidade trará novas dinâmicas imobiliárias e novas oportunidades”
Luis Nunes, CEO da ComprarCasa
João Bolou Vieira é da opinião de que há no país “o risco constante na gestão e planeamento de uma empresa ligada à habitação, porque a política está a mudar todos os dias”. Diz acreditar, por isso, que “os próximos anos podem ser de oportunidade para quem está de forma profissional no setor”.
“Para a procura pode ser um ano em que surja uma oportunidade para ter uma margem de negociação maior que não existia em 2022. Quem não comprou casa durante a pandemia arrependeu-se porque o preço dos imóveis está mais elevado. Em relação a players no mercado há agências e consultores que podem abandonar a atividade. Como [2023] foi um ano de redução, a falta de regulamentação deste mercado é um grande problema. Existem pessoas que estão neste mercado como segundo emprego”, remata o CEO do Homing Group.
Alfredo Valente, CEO da iad Portugal, prefere centrar atenções no acesso ao crédito habitação, que tende a ficar mais restrito e a impactar o negócio da mediação imobiliária. “A grande dificuldade prende-se com o acesso ao financiamento, o que pode impactar o volume de transações. Se uma casa em Portugal tem um custo, em média, de 200.000 euros, os capitais próprios exigidos para assegurar esse financiamento estão acima das possibilidades da maioria dos portugueses. Este problema coloca-se, sobretudo, aos jovens e às jovens famílias que pretendem entrar no mercado pela primeira vez”.
Paralelamente, reforça, “sendo a habitação um bem de primeira necessidade e um ativo que tende a valorizar com o tempo, o mercado imobiliário em Portugal ainda representa um investimento seguro e interessante, nomeadamente para quem, por exemplo, compra casa para arrendar”.

Periferias das grandes cidades na mira dos investidores
Para Rui Torgal, prudência é palavra de ordem em 2024, sobretudo em momentos como os atuais, marcados por um contexto económico e financeiro mais incerto. “Vamos assistir a critérios mais rigorosos, especialmente no primeiro semestre do ano, por parte de todos os intervenientes no mercado, desde clientes à banca. Mas considero que estamos longe de vir a assistir a um travão generalizado e ainda mais distantes de uma crise similar à do 'subprime'”, indica o CEO da ERA.
No que se refere às oportunidades para 2024, o responsável destaca o “surgimento de projetos residenciais muito interessantes concentrados sobretudo nas periferias das grandes cidades, que se revelam uma boa solução para as famílias portuguesas por apresentarem preços mais competitivos”.
"As periferias das grandes cidades tenderão a valorizar-se em consequência da contínua integração de famílias que procuram preços mais acessíveis fora dos centros urbanos, pelo que também continuarão a apresentar boas possibilidades de investimento”
Beatriz Rubio, CEO da Remax Portugal
Uma ideia também deixada por David Carapinha e Beatriz Rubio. “O ‘alargamento’ dos centros urbanos para as suas periferias continuará a ser uma tendência, que só não se mostra mais acentuada devido à fraca rede de transportes públicos. As periferias próximas aos principais centros urbanos são aquelas onde se podem encontrar as melhores oportunidades de investimento e onde se encontra habitação de valor mais acessível para as famílias. Torna-se mais evidente quando analisamos o número de novos projetos de construção que estão a nascer nestas áreas”, comenta o CEO da Home Tailors.
A CEO da Remax Portugal vai ainda mais longe, considerando que “as periferias das grandes cidades tenderão a valorizar-se em consequência da contínua integração de famílias que procuram preços mais acessíveis fora dos centros urbanos, pelo que também continuarão a apresentar boas possibilidades de investimento”. “Na verdade, as oportunidades existem e continuarão a existir transversalmente em todo o setor, em particular no segmento habitacional, pois este carece de uma maior e mais diversificada oferta”, frisa.
Paralelamente, remata Beatriz Rubio, a “construção sustentável, as energias renováveis e a eficiência energética, a par da digitalização e da utilização de novas tecnologias”, que são ainda tendências, serão “no futuro uma realidade do dia a dia”.
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