A falta de oferta de casas no mercado. A necessidade de construir mais fogos, visto que nos últimos anos o ritmo de construção caiu a pique. A dificuldade dos jovens em comprar casa devido aos baixos salários. A importância de pensar e de apostar forte no conceito da cidade dos 15 minutos e na mobilidade. A urgência de olhar para a habitação de outra forma, tendo em conta as reais necessidades das famílias e de encarar a construção modular como prática. Estes foram alguns dos temas em discussão no evento Observatório do Imobiliário, organizado pela Century 21 e realizado esta quinta-feira (6 de fevereiro de 2025) em Lisboa.
“Não temos um problema na habitação, temos um problema no acesso à habitação”. Esta foi uma das frases mais ouvidas ao longo do evento, tendo sido proferida, por exemplo, pela secretária de Estado da Habitação, Patrícia Gonçalves Costa, por Pedro Siza Vieira, ex-ministro da Economia, e por Paulo Portas, ex-ministro da Defesa e dos Negócios Estrangeiros.
O Casino de Lisboa, no Parque das Nações, encheu para ouvir estes e outros especialistas durante um evento no qual foi apresentado o estudo “Habitação para jovens em Portugal: desafios e tendências atuais”, desenvolvido pela mediadora imobiliária Century 21. Entre os participantes estiveram, além dos já mencionados, Ricardo Sousa, CEO da Century 21; Carlos Moreno, urbanista e criador do conceito “cidade de 15 minutos”; Pedro Marques Lopes, comentador na SIC Notícias; e os banqueiros João Pedro Oliveira e Costa (CEO do BPI), Miguel Maya (CEO do BCP) e Paulo Moita de Macedo (CEO da Caixa Geral de Depósitos).
Mobilidade e qualidade de vida
Durante a sua intervenção, Carlos Moreno enalteceu a necessidade de aumentar a qualidade de vida das pessoas e de regenerar as cidades. Proximidade, mobilidade e acessibilidade são palavras de ordem no conceito “cidade dos 15 minutos”, disse, salientando que o importante é “reduzir distâncias” e “ganhar tempo”, nomeadamente nos trajetos do dia a dia, como por exemplo casa-trabalho e trabalho-casa.
“A segregação urbana e a exclusão social são um problema, e é algo que se está a perpetuar no tempo. (...) Para haver proximidade é preciso combater a segregação urbana”
Carlos Moreno
“A casa não é apenas um telhado e paredes”, sustentou, colocado o foco na importância de oferecer “qualidade de vida às pessoas”, nomeadamente aos jovens, para que possam viver em localizações onde existam escolas, supermercados e outros serviços. E sempre em mobilidade, com boas acessibilidades. “Não significa viver na cidade”, alertou.
O especialista destacou a importância de se investir em projetos amigos do ambiente e sustentáveis e de se eliminar a dependência do carro, ganhando-se tempo nos trajetos quotidianos. “É preciso criar cidades vibrantes e inclusivas. A segregação urbana e a exclusão social são um problema, e é algo que se está a perpetuar no tempo. E assim a qualidade de vida piora. Para haver proximidade é preciso combater a segregação urbana”, desabafou, deixando no ar uma pergunta: Em que tipo de cidades queremos continuar a viver?
“Rendimentos não acompanham subida de preços das casas”
Entre os participantes no evento estiveram também Pedro Siza Vieira e Pedro Marques Lopes, comentadores da SIC Notícias. Pedro Siza Vieira, ex-ministro da Economia, falou na urgência que há no país de construir mais casas e de forma rápida, tal como tinha salientando por exemplo a atual secretária de Estado da Habitação. “São precisos 50.000 ou 60.000 fogos por ano”, disse, sublinhando que é crucial aumentar a oferta também do lado do setor público.
“Não temos um problema de habitação, temos um problema de acesso à habitação”, reforçou, pondo o dedo na ferida: o facto de os rendimentos das pessoas não estarem a acompanhar a tendência de subida de preços das casas.
Pedro Marques Lopes assinou por baixo, reiterando que o problema, ou um dos problemas, está na “adequação do rendimento” das pessoas ao setor imobiliário, isto a par, frisou, da falta de oferta de projetos residenciais, nomeadamente a preços que possam ser pagos pela generalidade das pessoas. E deixou um aviso: “Há muitos fogos e terrenos em Portugal disponíveis e sem uso”.
Banca disponível para ajudar setor imobiliário
Do lado da banca, João Pedro Oliveira e Costa (CEO do BPI), Miguel Maya (CEO do BCP) e Paulo Moita de Macedo (CEO da Caixa Geral de Depósitos) participaram num debate onde a falta de oferta de casas também esteve em discussão. E todos mostraram disponibilidade para ajudar a alavancar o setor, nomeadamente através da concessão de crédito habitação. Como sempre têm feito, asseguraram.
“Há procura, mas há que criar oferta de casas”, referiu Paulo Moita de Macedo, lembrando que a maioria das casas compradas no ano passado são usadas.
Quando questionado sobre se o banco público está atento ao negócio Build to Rent (BtR), ou seja, na promoção imobiliária de projetos residenciais construídos para serem arrendados, diz que financiou entidades nesse sentido, mostrando disponibilidade para esse tipo de projetos.
Do lado do BCP, Miguel Maya afirmou que o aumento do rendimento das pessoas resolve-se com a subida da produtividade das empresas e lembrou que os bancos têm sido sempre aliados do setor imobiliário, tendo-se apenas “afastado” na altura da Troika.
O banqueiro adiantou que, no caso do BCP, o incumprimento no crédito habitação sempre foi muito baixo, sendo os divórcios e as doenças os principais motivos que levam ao não pagamento da prestação da casa. O CEO do banco revelou ainda que, ao contrário de muitas pessoas, vê o crédito habitação como uma poupança.
Já João Pedro Oliveira e Costa, CEO do BPI, disse acreditar que é necessário “atuar com rapidez” e em sintonia para dar resposta ao referido problema existente de acesso à habitação. “Há que concretizar, partir para a ação”, referiu, frisando que “é preciso mais união” e que se perde no país “muito tempo a discutir soluções”.
Menos burocracias, mais produtividade e juros a descer
Coube a Paulo Portas a última intervenção, fazendo como que um resumo dos temas abordados ao logo do evento. O ex-ministro da Defesa e dos Negócios Estrangeiros bateu na mesma tecla, a de que é preciso aumentar em massa a oferta de casas e que o problema está no acesso à habitação. Paralelamente, assegurou, urge aumentar a produtividade por hora trabalhada, tendo o país um dos índices mais baixos da União Europeia neste indicador. E assim seria possível conseguir aumentar os salários médios em Portugal, que “são muito baixos” e estão a aproximar-se perigosamente do salário mínimo.
O ex-governante aproveitou a ocasião para dizer que não concorda com a visão de quem diz que já “não pode ver turistas à frente”, até porque o turismo, alertou, representa 20% do PIB nacional. E lamentou a “persistência da burocracia existente” no país, ficando-se anos à espera que se resolvam “coisas muito simples”. “Ao digitalizar a administração pública poupam-se processos”, frisou.
E será que o Banco Central Europeu (BCE) vai continuar a baixar as respetivas taxas de juro diretoras, à semelhança dos últimos meses, uma medida que terá, depois, impacto na descida das taxas Euribor e consequentemente na prestação a pagar ao banco pelo crédito habitação? “Acredito que podem descer mais duas ou três vezes este ano, o que é bom para o vosso setor [mediação imobiliária]”, rematou.
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