
A inflação está em alta em Portugal, tendo-se fixado em 8,9% em agosto, tal como confirmou o Instituto Nacional de Estatística. E está a refletir-se nos bolsos das famílias e empresas. Depois de apresentar um conjunto de apoios para ajudar as famílias a enfrentar a subida generalizada dos preços, o Governo anunciou esta quinta-feira, dia 15 de setembro, um pacote de medidas para apoiar as empresas face ao aumento dos custos com a energia, o qual vai custar mais de 1.400 milhões de euros. Entre elas destaca-se uma linha de crédito de 600 milhões de euros, o alargamento de apoios a indústrias de consumo intensivo de gás, apoios à formação e medidas de aceleração da eficiência e transição energética. Explicamos uma por uma neste artigo.
Este conjunto de apoios ainda está em Belém a aguardar luz verde de Marcelo Rebelo de Sousa. O Presidente da República confessa que ainda não fez uma “leitura específica” ao pacote de medidas apresentadas pelo Governo para apoiar as empresas. Mas assume que tudo deve “ter de ser reajustado e revisto em função da evolução das circunstâncias”.
10 medidas para apoiar as empresas face aos custos da energia
Estas são as principais medidas anunciadas pelo ministro da Economia e do Mar, António Costa Silva, esta quinta-feira para ajudar as empresas a atenuar os efeitos da inflação nos custos da energia:
Linha de crédito de 600 milhões de euros
O ministro da Economia e do Mar, António Costa Silva, anunciou o lançamento de uma nova linha de crédito de 600 milhões de euros destinada às empresas direta ou indiretamente afetadas pelo aumento acentuado dos custos energéticos e das matérias-primas e pelas perturbações nas cadeias de abastecimento. Com execução a partir da segunda quinzena de outubro, esta linha tem um prazo de oito anos e carência de capital de 12 meses.
Apoio à eficiência e aceleração da transição energética na indústria e agricultura
Outra medida passa por apoiar a aceleração da transição energética nas empresas que operam no domínio industrial e agrícola. O objetivo passa por:
- Descarbonizar o domínio industrial;
- Produzir energias renováveis;
- Incentivar a mudança de fontes de energia;
- Reduzir emissões;
- Monitorar o consumo.
O valor total destes apoios é de 290 milhões de euros, com execução a partir de 1 de outubro.

Apoios ao emprego ativo e à formação qualificada de trabalhadores
O Governo pretende com esta medida atingir uma otimização dos tempos de produção, o suporte à formação em contexto laboral e à preservação do emprego, tendo destinado 100 milhões de euros para a sua execução, que começará imediatamente.
Reforço ao apoio às indústrias intensivas em gás
Esta medida terá um valor global de 235 milhões de euros e prevê duas modalidades:
- Aumento do apoio por empresa passa de 400 para 500 mil euros;
- Taxa de apoio de 30% para 40% dos custos com gás natural face ao ano anterior, "desde que haja mais do dobro dos gastos em energia", esclareceu o ministro António Costa Silva
As empresas com maior uso de gás podem ter acesso a valores até 2 milhões de euros e aquelas em risco de fechar até 5 milhões de euros. Este programa será implementado depois da aprovação da Comissão Europeia.
Apoio à promoção externa e internacionalização das empresas
Esta medida tem como objetivo o reforço da presença internacional das empresas, acesso a novos mercados e promoção externa. Avaliada em 30 milhões de euros, estará no terreno ainda este mês.

Apoio financeiro ao setor ferroviário de mercadorias
De acordo com o executivo, esta medida extraordinária para operadores de transporte ferroviário de mercadorias terá um valor total de 15 milhões de euros e execução a partir de 11 de outubro.
Para as locomotivas a diesel serão pagos 2,64 euros por quilómetro e para as de tração elétrica a subvenção será de 2,11 euros por quilómetro. Esta ajuda visa resolver uma situação de injustiça face ao transporte rodoviário de mercadorias, sublinhou António Costa Silva na ocasião.
Extensão da revisão de preços nos contratos públicos
Outra medida desenhada por Governo passa por alargar até junho de 2023 a revisão extraordinária de preços nos contratos públicos, uma forma de “sossegar” o setor da construção, segundo disse o ministro da Economia.
Linha de financiamento ao setor social
Esta medida implica uma nova linha de financiamento ao setor social, com um máximo de 250 milhões de euros e uma comparticipação financeira para as instituições particulares de solidariedade social ou entidades equiparadas sem fins lucrativos face ao aumento do valor do gás, de 120 milhões de euros. Este programa vai ser executado em outubro.
Formação e requalificação em competências verdes
O objetivo desta medida, avaliada em 20 milhões de euros, é a formação e requalificação de trabalhadores e desempregados, a manutenção de postos de trabalho e a criação de emprego qualificado no âmbito da aceleração da transição e eficiência energética. Para executar a partir da segunda quinzena de outubro.

Medidas fiscais: suspensão de IPS e taxa de carbono sobre gás e luz
“Faz parte deste pacote, um conjunto de medidas fiscais que pensamos que são muito importantes para as empresas, que foram articuladas com o Ministério das Finanças, que envolvem a suspensão temporária do Imposto sobre os Produtos Petrolíferos e da taxa de carbono sobre o gás natural, sobretudo o utilizado na geração de eletricidade e de cogeração”, anunciou António Costa Silva.
A suspensão temporária do ISP e da taxa de carbono sobre o gás natural utilizado na produção de eletricidade e cogeração será de execução imediata. E só esta medida está avaliada em 25 milhões de euros. Por outro lado, o executivo vai atribuir uma majoração de IRC em 20% aos gastos com a eletricidade e o gás natural, fertilizantes, rações e outra alimentação para a atividade de produção agrícola.
Ainda na parte fiscal, será prorrogado o mecanismo de gasóleo profissional extraordinário (GPE) até final do ano e da redução temporária do ISP aplicável ao Gasóleo Agrícola até final do ano, medidas também aplicadas imediatamente.

As reações do setor ao novo pacote de medidas …
Ao analisar este novo conjunto de apoios, a Confederação do Comércio e Serviços de Portugal (CCP) defendeu que as medidas apresentadas pelo Governo para apoiar as empresas face à escalada energética são “tardias e redutoras”, “porque parte do pressuposto que apenas alguns setores são penalizados pelo agravamento do custo do gás e da eletricidade”. A confederação notou que o Governo “parece ignorar” com estes apoios o setor dos serviços, incluindo o comércio, que “representa 35% do consumo energético total do país”.
Já no que se refere aos contratos públicos, a confederação do comércio e serviços reiterou que o mecanismo de revisão de preços deve ser revisto, “de forma a ser efetivamente aplicado em todos os setores de atividade, nomeadamente aos setores prestadores de serviços ao Estado”.
Por seu turno, a CIP - Confederação Empresarial de Portugal considera que “as medidas de apoio às empresas apresentadas pelo Governo vão no sentido correto”. E reconhece que “as medidas anunciadas, que terão de ser executadas imediatamente, sem perdas de tempo e sem as tradicionais burocracias que tudo dificultam, podem ajudar as empresas de diversos setores a gerir melhor as dificuldades, nalguns casos extremas, que enfrentam e ameaçam a sua sobrevivência e, por conseguinte, a manutenção do emprego”.
De acordo com a confederação, “a definição de incentivos que favorecem os investimentos destinados à transição e eficiência energéticas, a majoração dos custos em sede de IRC e, ponto relevante, a prorrogação de uma norma de atualização extraordinária de preços — que não pode aplicar-se apenas às empreitadas públicas, tem de ter um escopo mais alargado — podem também ajudar a mitigar as enormes perdas que se acumulam há longos meses”, destacando ainda “o alargamento dos apoios ao setor agroalimentar, área fundamental para Portugal”. Já no que toca à nova linha de crédito, diz que a medida “pode ser útil, mas em regra as empresas não precisam de mais endividamento”.

O que dizem os partidos deste pacote de medidas de apoio às empresas?
Em reação ao novo pacote de medidas, os partidos criticam o facto de os apoios não abrangem todas as empresas (nomeadamente as pequenas e médias) que necessitam de apoios para mitigar os custos elevados da energia. E consideram que as empresas não precisam de linhas de crédito para ficar ainda mais endividadas.
PSD
Em reação ao novo pacote de medidas, “o PSD manifesta a sua enorme desilusão, nós fizemos a nossa parte, tudo fizemos para trazer o Governo ao debate com medidas que efetivamente pudessem ajudar os portugueses e o Governo nem sequer tem a desculpa de não ter dinheiro”, defendeu Paulo Rios de Oliveira, do PSD.
Partido da oposição critica medidas com recursos a empréstimos. “O programa do Governo em bom rigor é constituído maioritariamente por empréstimos, sempre a reboque daquelas expressões que os socialistas gostam de usar, um nome bonito para o pacote ‘Energia para Avançar’ e depois algo para a formação, para o transporte, para as linhas de apoio, mas na realidade deveriam estar mais preocupados na abrangência, porque o que era urgente para alguns, neste momento é urgente para todos”, alertou.
BE
A coordenadora do BE considerou que as medidas para o setor empresarial são “muito curtas” e sem capacidade de chegar às pequenas empresas. “O Governo dá apoios em miniatura, de faz de conta às famílias e às empresas porque se recusa àquele passo de justiça económica que é taxar os lucros excessivos das gigantescas empresas que estão a ganhar com a inflação, e essa é a escolha da maioria absoluta. Não há nenhum argumento a não ser este, decidir proteger o privilégio”, criticou Catarina Martins numa primeira reação ao plano extraordinário de apoio às empresas.
“Cada dia que a medida é atrasada quer dizer que há lucros excessivos que não são taxados. Entretanto as empresas distribuem os seus lucros em dividendos, entretanto quando for o apuramento dos lucros excessivos eles já não existem para serem apurados e para serem taxados”, avisou.
PCP
Em reação às medidas aprovadas em Conselho de Ministros, a líder parlamentar do PCP, Paula Santos, considerou que o Governo apresentou um pacote de apoio “insuficiente”, que não teve em consideração “as micro, pequenas e médias empresas” e “não avança com medidas concretas” para fixar os preços da energia.
“Não fixar e tabelar os preços significa na prática a subsidiação dos grupos económicos do setor energético. Não travar o aumento de preços significa que os apoios podem ser consumidos com o continuado aumento dos preços”, advogou.
Paula Santos registou ainda “a resistência por parte do Governo em tributar os lucros [extraordinários] dos grupos económicos”, medida defendida pelos comunistas.

Iniciativa Liberal
A Iniciativa Liberal também criticou as medidas do Governo de apoio às empresas, classificando-as como um conjunto de “remendos e medidas recicladas que nada fazem pelas empresas”.
Na opinião do deputado, “o que faria era um conjunto de reformas estruturais”, vincando que “as boas empresas não precisam de subsídios” e criticando o peso da burocracia.” As boas empresas são capazes de crescer sem terem este permanente pedido de auxílios ao Estado. As empresas que farão do país mais competitivo não precisam de subsídios do Estado em qualquer altura”, sublinhou.
O que é necessário, segundo a IL, é que as empresas possam crescer e desenvolver-se “para que possam estar capitalizadas durante os períodos bons para fazer face aos períodos maus”. Neste contexto, as medidas do Governo “tudo o que farão é aumentar o endividamento das empresas”.
Chega
O Chega lamentou que o Governo tenha anunciado “poucos apoios novos” para as empresas, considerando que se limitou a aumentar os que já existem e a avançar com medidas “mais do mesmo”. “Mais uma vez o Governo faz uma apresentação de retoques, de remendos e de truques para maquilhar o que é a verdade. Poucos apoios novos existem, estamos a falar de aumentos de linhas que já existem e de apoios que já existem”, defendeu o presidente do Chega.
“Tirando a formação, o pacote apresentado significa muito pouco nas contas finais da maior parte das empresas”, considerou André Ventura, advogando que “a maior parte do universo empresarial português fica de fora destes apoios”.
André Ventura criticou ainda a linha de crédito de 600 milhões de euros aprovada pelo Governo, defendendo que empresas já endividadas vão aumentar a sua dívida, “o que significa que algumas vão fechar portas”, vincou.
Na opinião de Ventura, houve três medidas fundamentais que o Governo deveria ter anunciado: “o ‘lay off’ simplificado, a redução dos impostos no âmbito do gás e eletricidade para as empresas e sobretudo [a redução] de impostos sob os combustíveis”.
Livre
O deputado único do Livre considera “incompreensível” a apresentação de “um pacote tão modesto”. E chamou a atenção para “dois problemas” na medida anunciada de uma linha de crédito de 600 milhões de euros, operacionalizada pelo Banco de Fomento. Na opinião do deputado, o Banco de Fomento “tem de começar a funcionar com outra maneira”, uma vez que “não está a chegar às pequenas e médias empresas”.
Em segundo lugar, continuou, “não chega, porque um apoio às empresas que pode ir buscar o excedente do IVA, que pode ir buscar a folga que existe nas regras europeias e no próprio défice, que pode ir buscar um imposto sobre lucros excessivos de empresas, pode facilmente ter o dobro ou o triplo do tamanho deste”.
“Um governo que já estava atrasado em relação ao debate europeu, um governo do PS que se deixou ultrapassar pela esquerda por governos que são de centro direita na Europa e até pela presidente da Comissão Europeia, vai continuar a esperar para ver, em vez de ir buscar àqueles que neste momento estão a lucrar mais com esta crise algum do dinheiro que é preciso para ajudar os que estão a sofrer mais”, acrescentou.
PAN
A deputada única do PAN, Inês Sousa Real, lamentou que o Governo não tenha avançado com um imposto sobre os lucros extraordinários e apontou para uma “falta de arrojo” por parte do executivo.
“Estar a criar uma linha de mais endividamento, ou seja, ao invés de dar apoios diretos, ao invés de haver uma redução no IRC para que possamos de forma mais séria, ainda que fosse provisória até à discussão do próximo orçamento, garantir que havia um alívio fiscal das empresas e pensando acima de tudo nas pequenas e médias empresas, era fundamental que as medidas do governo não fossem mais endividamento, porque as faturas não vão desaparecer magicamente”, alertou.
*Com Lusa
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