Setor imobiliário atravessa mais um desafio, mas reina a confiança e o otimismo na banca e entre os promotores imobiliários.
Comentários: 0
Custos de construção e promoção imobiliária em Portugal
Photo by Freguesia de Estrela on Unsplash

O “fantasma” do aumento dos custos de construção paira no país, tendo a guerra na Ucrânia ajudado a contribuir para fazer disparar, por exemplo, o preço dos materiais. Uma tendência que já vinha da pandemia e que ganha agora novos contornos, com o país (e o mundo) a braços com uma inflação que teima em não parar de subir. Tudo isto se pode repercutir, em última instância, no preço final das casas, que também tem disparado nos últimos tempos.

Para já, no entanto, os promotores imobiliários mostram sinais de resiliência e adiantam que os projetos continuam a sair do papel a tempo e horas. Já os bancos dizem estar atentos à conjuntura atual e reforçam a ideia de que estão disponíveis para financiar a construção de casas.

Estas são duas das conclusões a retirar das conferências que se realizaram esta terça-feira (7 de junho de 2022) em Lisboa, na sede da Abreu Advogados, e que contaram com a participação de vários players do setor imobiliário

Bancos mantém-se ativos

  • BPI

João Patrício, do BPI, foi o primeiro dos participantes a intervir no debate. Disse que a banca está “muito melhor que na última crise financeira” e que todo “o sistema bancário está muito mais sólido”. “Prova disso foi a pandemia, onde a banca foi fundamental. (…) A banca está bem e o sistema bancário está pronto para esta nuvem [inflação e custos de construção a subir]. (…) Temos desafios pela frente, mas quero passar uma mensagem de otimismo”, frisou. 

  • CGD

Uma ideia, de resto, deixada pelos restantes intervenientes. “Os custos de construção são um enorme desafio. É uma preocupação nos novos financiamentos que analisamos. Há projetos que estão ‘ongoing’ e que foram contratados com indicadores diferentes dos de hoje. Isso é uma preocupação atual”, disse Cristina Fontes, da CGD. 

“Um dos desafios é fazer as melhores analises de stress e perceber que condicionalismos poderá haver, para haver níveis de risco o mais controlados possíveis. O objetivo é tentar antecipar aquilo que pode acontecer, sendo que é importante para o banco garantir que o construtor e o promotor conseguem terminar a obra a tempo”, acrescentou. 

Construção em Portugal
Photo by Ilja Tulit on Unsplash
  • Santander Totta

Do lado do Santander Totta, António Fontes afirmou que nunca se chegará ao risco de haver uma crise financeira como a de 2008 e que os bancos estão agora “muito mais fortes”, estando o crédito habitação “mais controlado”. 

O responsável adiantou que o Santander tem cerca de 700 projetos de promoção imobiliária em curso e que fez um inquérito aos promotores já em tempos de guerra para saber como está o mercado: “Estavam todos muito tranquilos. Hoje já estão mais recetivos a fazer ajustamentos para que não haja problemas durante a obra. Estamos muito tranquilos com a nossa carteira”. 

Sobre operações futuras, avisou que é necessário “criar novas soluções”, mas frisou que o banco não tem “qualquer tipo de restrição de financiamento imobiliário”, apesar de se estar perante um novo paradigma. 

  • BCP

Luís Vaz Pereira, do BCP, assegurou que o aumento dos custos de construção é mais um fator que os bancos têm de ter em conta, sendo que os projetos que estão “em carteira estão bastantes resilientes”. “Há sinal de alguma tranquilidade. Há medidas a tomar sobre os custos de construção, mas tentar fazer com custos fixos é impossível, o caminho é fazer em ‘open book’ (aberto). E mesmo num contrato em preço fixo, tem de haver bom senso de parte a parte para que a obra possa ser concluída”, notou. 

Uma coisa é certa, a vontade do BCP “é continuar a financiar dentro dos critérios” que o banco tem “vindo a seguir há algum tempo”. “A principal preocupação é que o projeto possa ser concluído. Promotores e bancos devem ter isso em conta sempre e isso é o que tentamos fazer nos novos projetos”, concluiu Luís Vaz Pereira.

  • Novo Banco

Uma opinião partilhada por Ana Oliveira, do Novo Banco, que revelou que a entidade fez uma reorganização interna de forma a haver equipas especificas dedicadas à parte da promoção imobiliária e do financiamento do setor. “Tentam entender os riscos do projeto e estruturar as operações para fazer face a estas situações mais anormais do mercado. (…) Fazemos sempre um cenário de nível de stress para saber se o projeto acomoda ou não certas preocupações”, explicou.  

De acordo com a responsável, é sempre fundamental, mas sobretudo em contextos como os que se vivem atualmente, “não quebrar confiança” e “trabalhar com os clientes, dialogar e não parar obras”.

Construção de casas em Portugal
Photo by Brett Jordan on Unsplash

Promoção imobiliária resiliente

Do lado dos promotores imobiliários, coube a Nuno Ravara, da Finsolutia, abrir as hostilidades do segundo painel da conferência, dedicada à visão dos promotores imobiliários sobre o atual momento do setor. Sublinhou que os custos de construção são um tema incontornável e que “o fornecimento de materiais à construção funciona a nível global”.

Referiu, ainda assim, que o setor da construção deverá ser um dos que mais vai crescer e mais vai contribuir para o crescimento da economia mundial. “Não há razão para que se altere o bom momento que se vive em Portugal”, disse. 

Cristóbal de Castro, da Albatross, confirmou que se vive atualmente um “contexto difícil” e que é complicado gerir os custos de construção, mas adiantou que todos os projetos da empresa estão a ser entregues no “prazo previsto e sem aumento de preços”. 

Sobre a aposta no tão falado mercado Build to Rent (construir para arrendar), o responsável considera que ainda há um longo caminho a percorrer em Portugal, até porque os bancos estão “muito cómodos com o Build to Sell (construir para vender)”, havendo ainda “muitas incertezas”. 

Sustentabilidade na construção
Photo by Greyson Joralemon on Unsplash

“A madeira é claramente o futuro"

Otimismo é palavra de ordem na Vanguard Properties. José Cardoso Botelho é da opinião que o segmento de luxo tem reagido melhor às várias crises, como por exemplo a pandemia, e que está também a dar boa resposta atualmente. Um dos exemplos que deu foi o de ter comprado alguns materiais antecipadamente, evitando, assim, “a subida dos preços e reduzindo o risco de um eventual sobrecusto”. 

“No segmento onde estamos mais presentes, o luxo, o tipo de cliente que está a procurar Portugal nunca foi tão bom. É o caso dos clientes dos EUA”, referiu, notando que a aposta passa por investir na industrialização e na sustentabilidade. “A madeira é claramente o futuro. Na Comporta não usamos betão. Do ponto de vista industrial é uma mais-valia. Estamos a receber muitos clientes norte-americanos, e na Comporta não lhes passa pela cabeça não construir sem ser em madeira”. 

Aniceto Viegas, da Avenue, disse acreditar que é possível “encontrar soluções” para o problema dos custos de construção, com parceiros e com o recurso à industrialização. Aproveitou a ocasião para pôr o dedo numa ferida antiga: “Os atrasos nos prazos de licenciamento em Lisboa são um grande problema. Lisboa está com uma lentidão administrativa que prejudica muito o investimento imobiliário na cidade. O Porto está a aproveitar muito bem esta situação. Em termos administrativos funciona melhor e tornou-se uma cidade incontornável para viver, trabalhar, etc.”. 

"Os atrasos nos prazos de licenciamento em Lisboa são um grande problema. Lisboa está com uma lentidão administrativa que prejudica muito o investimento imobiliário na cidade"
Aniceto Viegas, CEO da Avenue

Do lado da Norfin, Francisco Sottomayor sublinhou que problemas no setor imobiliário vai haver sempre e que os vários players do setor têm de “ter a agilidade para os resolver”. “Mas Portugal está numa posição ótima e o imobiliário tem o seu papel importante de impulsionar o crescimento”, salientou. 

E será que os preços das casas irão continuar a aumentar? Segundo Francisco Sottomayor sim, até porque o facto de haver menos oferta significa, depois, a existência de preços mais altos. “Os preços vão continuar a subir e a própria inflação impulsiona isso. Vai ser mais caro financiar a aquisição no futuro, o que pode ajudar a dinamizar um certo mercado de arrendamento. Investidores a comprar para colocar a arrendar vai ganhar força”, concluiu. 

Ver comentários (0) / Comentar

Para poder comentar deves entrar na tua conta