
As casas para arrendar em Portugal são escassas para a tamanha procura que se regista nos últimos anos. Aquele que, em teoria, parece ser um bom negócio imobiliário não tem tido, contudo, um aumento expressivo no mercado nacional. Para tornar o arrendamento mais atrativo e aumentar a oferta de casas para arrendar, o Executivo socialista de António Costa aprovou uma série de medidas no Mais Habitação, mas nem todas foram bem-vindas. Afinal, o que falta fazer para incentivar os proprietários colocar mais casas a arrendar? Os especialistas ouvidos pelo idealista/news consideram que é preciso haver mais confiança nos governantes, estabilidade na legislação, maiores reduções nos impostos e ainda maior equidade nas leis que protegem os senhorios e inquilinos. Estas são algumas pistas que o novo Governo formado pela Aliança Democrática - força política mais votada nas eleições legislativas de domingo passado - deverá ter em conta nesta legislatura.
A procura de casas para arrendar está em alta em Portugal. O relatório residencial anual do idealista/data concluiu que - devido aos elevados preços das casas à venda sem o acompanhamento real dos rendimentos das famílias, a par do atual contexto económico de inflação e juros altos - o arrendamento está mesmo a ganhar importância face à compra de casa, sendo que o interesse em arrendar casa chega a ser 23 vezes superior. Mas a escassa oferta de casas para arrendar tem-se revelado o principal travão à evolução destes negócios. Isto porque o arrendamento constitui um negócio de alto risco, perante as pesadas cargas fiscais, possível danificação do imóvel, incumprimento do pagamento das rendas e processos de despejo demorados, segundo argumentam os especialistas.
Foi no sentido de aumentar a oferta de casas para arrendar que o Governo de maioria absoluta de Costa - ainda em gestão até o próximo Executivo tomar posse - desenhou várias medidas no Mais Habitação, em vigor há cerca de cinco meses. Mas nem todas foram bem recebidas pelos proprietários. Os especialistas comentam ao idealista/news que a redução de IRS sobre as rendas, a maior proteção dos senhorios e até a transferência do Alojamento Local para o mercado de arrendamento podem ajudar a disponibilizar de casas para arrendar. Já o travão à subida das rendas nos novos contratos e o arrendamento coersivo de casas devolutas aumenta os receios e desincentiva o mercado.
Arrendar casa em Portugal: como está a evoluir a procura?
A procura de arrendamento tem sido sempre superior à oferta de imóveis disponíveis no país. “As zonas mais desenvolvidas, principalmente junto ao litoral, têm uma maior procura e sofrem mais com a insuficiência de imóveis. No entanto, a problemática da falta de oferta é global, tendo em conta que em todas as zonas do país existe carência de imóveis para dar a resposta necessária”, explica Francisco Reganha, country manager da Aluga Seguro, em declarações ao idealista/news.
Apesar de o Governo de Costa ter querido incentivar os contratos de arrendamento de longa duração através de maiores reduções do IRS sobre os rendimentos prediais, o que se tem sentido no mercado é que há cada vez mais contratos de menor duração (média de 2 ou 3 anos). “Para os inquilinos há sempre procura de contratos de arrendamento de média duração, uma vez que podem sair passado um terço da duração do contrato e até antes disso, se tiverem motivo justificado”, refere Luís Menezes Leitão, presidente da Confederação Portuguesa de Proprietários (CPP).
Muitos destes contratos de arrendamento de média duração são procurados por trabalhadores em mobilidade profissional e também por jovens casais que não conseguem aceder ao crédito habitação para aquisição de casa própria, sobretudo devido aos baixos salários e alta carga fiscal, que dificulta também o pagamento das rendas praticadas no mercado. Mas há procura por parte de “inquilinos estrangeiros (oriundos de países externos à União Europeia), que nos últimos anos escolheram Portugal para viver ou trabalhar e refugiados de países em guerra. Atualmente, o número de inquilinos estrangeiros em procura ativa de imóveis para arrendamento é amplamente superior ao número de inquilinos portugueses”, revela o responsável em Portugal pela Aluga Seguro.
O que se espera num futuro próximo é que a procura de casas para arrendar continue a ser muito superior à oferta de imóveis disponíveis para arrendamento, continuando, assim, a aumentar as rendas das casas. Na visão do presidente da CCP, “as rendas continuarão a subir, não por força do aumento da procura, mas sim por causa da falta de oferta. Os senhorios portugueses estão traumatizados por um século de congelamento de rendas e as medidas que têm sido implementadas pelo PS (…) só agravam a situação, levando a que muito poucos senhorios queiram investir na colocação de casas para arrendar”, conclui.
Ainda que as medidas do programa Mais Habitação “venham contribuir para uma estabilização da subida de preços, as demais medidas que, porventura, poderiam prover ao mercado mais imóveis para arrendamento não serão eficazes a curto médio prazo para dar resposta à falta de oferta. Portanto, tendo em conta a procura crescente de imóveis para arrendar, a chamada crise do arrendamento prevalecerá enquanto não se promova mais construção e criem medidas de verdadeiro incentivo junto dos proprietários de imóveis devolutos”, refere Francisco Reganha.

Incentivar os proprietários a apostar no arrendamento: o que é preciso fazer?
Para os especialistas ouvidos pelo idealista/news ainda há muito que se pode fazer para incentivar os proprietários a colocar mais casas no mercado de arrendamento. E deixam pistas ao novo Governo escolhido nas eleições legislativas de 2024 para que haja maior oferta de casas para arrendar no futuro:
- Maior credibilidade e estabilidade legislativa: em Portugal há “falta de confiança dos proprietários num regime jurídico do arrendamento, que é sistematicamente alterado em seu prejuízo. Enquanto não houver um parlamento e um Governo que devolvam aos proprietários a confiança no mercado de arrendamento, não há incentivos que os levem a colocar as suas casas no mercado”, resume o presidente da CCP.
- Maior equidade de direitos e deveres entre inquilinos e senhorios: Francisco Reganha acredita que é preciso que “haja leis mais equitativas, que também protejam os proprietários e os seus investimentos”, pelo que “a justiça necessita ser menos burocrática e mais célere, nomeadamente nos tribunais, que continuam a demorar mais de um ano para julgar ou executar uma ação de despejo”;
- Redução de IRS sobre rendimentos prediais: “A descida da taxa autónoma aplicada sobre os rendimentos prediais, de 28% para 25%, poderá ser um ponto atrativo para os senhorios, em especial, no arrendamento de longa duração”, avalia Patricia Boavida, advogada associada sénior na Belzuz Abogados, referindo-se à medida aplicada no Mais Habitação. Também Filipe Pereira Duarte, advogado sénior na CRS Advogados, admite que “a possibilidade de um proprietário obter uma melhor eficiência fiscal na exploração de um imóvel, seja pela via do arrendamento, ou através de outras formas de exploração, depende, na maioria dos casos, das circunstâncias especificas do locado e do enquadramento fiscal e rendimentos do proprietário”;
- Mais apoios aos senhorios para remodelar as casas: “É necessária uma aposta mais abrangente para reabilitação do parque habitacional, focada no arrendamento, apoiando aqueles proprietários que necessitam remodelar e adequar os seus imóveis e que por motivos financeiros não conseguem realizar esse investimento, optando por mantê-los desocupados ou noutros casos arrendados sem condições de habitabilidade”, acrescenta Francisco Reganha.
- Maior regulação e fiscalização dos imóveis arrendados: “É preciso também uma maior supervisão às condições de habitabilidade de muitos imóveis irregulares, que pela falta de oferta e fiscalização, continuam a ser arrendados, por vezes informalmente, sem cumprir quaisquer requisitos mínimos de salubridade e segurança”, sublinha ainda o responsável da Aluga Seguro em Portugal, que frisa a necessidade de profissionalizar o setor.
Portanto, para aumentar a oferta de casas no mercado de arrendamento em Portugal é preciso, segundo a visão dos especialistas auscultados pelo idealista/news, haver estabilidade legislativa, mais proteção dos senhorios, redução de impostos, mais apoios aos proprietários para remodelar casas antigas e ainda uma maior fiscalização dos imóveis arrendados. Importa agora saber todos os passos e documentos necessários para colocar uma casa para arrendar.

Como colocar uma casa a arrendar: do contrato às rendas
Quem é proprietário e pondera colocar um imóvel para arrendar – ou até afetar a sua segunda casa ao arrendamento -, “fá-lo numa dupla perspetiva: a de adquirir ou manter património, ainda considerado como um bom investimento, e através deste, ter um rendimento associado”, refere Patricia Boavida, da Belzuz Abogados.
Mas na hora de colocar uma casa no mercado de arrendamento, o proprietário necessita de ter em conta vários aspetos, recorda Filipe Pereira Duarte, advogado sénior na CRS Advogados:
- verificar se imóvel tem certificado energético válido, caso contrário tem de o obter;
- verificar se está devidamente licenciado para os fins a que se destina o arrendamento – de notar que apesar de o novo simplex urbanístico ter permitido a compra e venda de casas sem a apresentação obrigatória da licença de utilização, este diploma não veio alterar as regras do arrendamento urbano, pelo que arrendar casa sem licença é ilegal;
- confirmar a certidão do registo predial e caderneta predial urbana “de forma a sanar eventuais incongruências ou deficiências que possam impedir ou dificultar o arrendamento”;
No que respeita aos aspetos jurídicos, o contrato de arrendamento deverá ser celebrado por escrito e ser incluir os seguintes aspetos, resume Francisco Sousa Coutinho, da CCR Legal, ao idealista/news:
- a identidade das partes, incluindo naturalidade, data de nascimento e estado civil;
- a identificação e localização do arrendado, ou da sua parte;
- o fim habitacional, indicando, quando para habitação não permanente, o motivo da transitoriedade;
- o valor da renda;
- a data da celebração;
- a existência da licença/autorização de utilização, o seu número, a data e a entidade emitente, ou a referência a não ser aquela exigível, por a construção do locado ser anterior a 1951 (caso em que deve ser anexado ao contrato documento autêntico que demonstre a data de construção).

Como definir a renda da casa e caução?
Quanto à renda da casa, importa recordar que a renda pode ser livremente estipulada se o imóvel for colocado no mercado pela primeira vez. Mas se a habitação tiver sido arrendada nos últimos cinco anos, a renda inicial do novo contrato de arrendamento só poderá subir 2% em relação à última renda, segundo estipulou o Mais Habitação. “Se não tiverem sido promovidas atualizações de renda no decurso do contrato de arrendamento anterior, pode também ser incrementado na nova renda o valor resultante desses aumentos, com a especial nota que, nesse caso, a aplicação do coeficiente de atualização para o ano de 2023 é de 1,0543, não sofrendo as limitações da ‘norma travão’ de 2%” aplicada nesse ano, recorda Filipe Pereira Duarte.
Também é importante inclui no contrato de arrendamento uma clausula relativa às condições de atualização da renda. Na ausência de acordo, a renda poderá ser anualmente atualizada com base no coeficiente apurado a partir da inflação, que em 2024 foi de 6,94%. Ou seja, a renda da casa pode subir até um máximo de 6,94% este ano para os contratos existentes.
Além de tudo isto, é igualmente importante definir os termos relativos ao pagamento antecipado da renda e caução. “Nos termos da lei, o senhorio pode exigir o pagamento antecipado de até dois meses de renda, bem como exigir o pagamento de uma caução até ao valor correspondente a duas rendas”, lembra Francisco Sousa Coutinho.
Também é aconselhável que a forma de cessação dos contratos de arrendamento habitacional esteja claramente estabelecida no contrato (nomeadamente, oposição à renovação, denúncia e resolução), “de modo a proporcionar uma estrutura clara do mesmo e a prever possíveis cenários, protegendo os interesses de ambas as partes”, acrescenta o especialista da CCR Legal, que nota ainda que “o senhorio poderá ainda solicitar a constituição de um fiador para dar uma maior garantia do cumprimento das obrigações do contrato da parte do arrendatário”.

Quando comunicar o arrendamento à AT?
Depois de assegurados todos estes pontos, o senhorio deverá comunicar o arrendamento à Autoridade Tributária (AT) até ao fim do mês seguinte ao início do arrendamento e deverá pagar o Imposto do Selo, “sob pena de, não o fazendo, poder ser aplicada uma coima entre 150 e 3.750 euros, e eventual impossibilidade de utilizar o Procedimento Especial de Despejo junto do Balcão do Arrendatário e do Senhorio em caso de litígio com o arrendatário”, avisa ainda.
De notar ainda que se o imóvel arrendado estiver hipotecado ao banco (na sequência de um crédito habitação), “é comum que os contratos bancários obriguem o mutuário a comunicar e solicitar autorização ao banco, sempre que se pretenda arrendar o imóvel”, alerta também Filipe Pereira Duarte, da CRS Advogados.
A verdade é que “prevenção continua a ser a melhor opção”, pelo que na hora de mergulhar no mundo do arrendamento, “os proprietários deverão aconselhar-se junto de profissionais qualificados, ponderando os termos do contrato, analisando e avaliando previamente os candidatos a inquilinos, bem como a exigência de garantias adicionais ao cumprimento do contrato”, conclui Patricia Boavida.
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