O que esperar do setor? Vão chegar mais casas ao mercado? Que impacto terá a lei dos solos? Têm a palavra os promotores imobiliários.
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Promoção imobiliária em Portugal
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São precisas mais casas em Portugal para dar resposta(s) à procura existente. E casas que possam ser compradas pela generalidade das pessoas, nomeadamente as da chamada classe média. O alerta não é novo, mas volta a ser agora novamente reiterado pelos vários players do setor imobiliário em Portugal. Do lado dos promotores, há vontade para investir e apostar no aumento da oferta de habitação, que ainda não deverá acontecer – pelo menos em escala, de forma a fazer face às necessidades – em 2025, antecipam. E são muitos os desafios existentes, “feridas” de um passado que teimam em não sarar. 

“As previsões para 2025 indicam que a oferta de novas habitações poderá não acompanhar a crescente procura, mantendo-se insuficiente para satisfazer as necessidades habitacionais, sobretudo nas grandes áreas urbanas”. O ‘felling’ de João Cabaça, CEO da VIC Properties, é partilhado, regra geral, pelos responsáveis das várias promotoras imobiliárias contactadas pelo idealista/news. “A procura continuará a ser maior que a oferta, sobretudo para o mercado doméstico da classe média e média alta, devido à falta de soluções estruturais”, sustenta Luís Corrêa de Barros, CEO da Habitat Invest.

O idealista/news foi sentir o pulso ao mercado da promoção imobiliária para tentar perceber o que esperar de 2025 para o setor. São as promotoras, afinal, que andam no terreno a lançar e desenvolver projetos residenciais.  

Desafios da promoção imobiliária em Portugal em 2025
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O que esperar do setor da promoção imobiliária em 2025?

Para João Cabaça não há dúvidas, em 2025, o setor “vai continuar a exigir dos promotores uma forte capacidade de adaptação às novas tendências dos consumidores e do capital que os financia”. “O tema da sustentabilidade continuará a estar na ordem do dia, com uma crescente procura dos consumidores por projetos sustentáveis, quer a nível ambiental, económico e social”, acrescenta. 

O CEO da VIC Properties, promotora que viu ser aprovado no final do ano passado, por parte da Câmara Municipal de Lisboa, o megaprojeto imobiliário na Matinha, considera que as principais cidades do país “deverão continuar a atrair investimentos significativos de diversos promotores, nacionais ou internacionais”, nomeadamente no segmento residencial. 

"Em 2025, o setor vai continuar a exigir dos promotores uma forte capacidade de adaptação às novas tendências dos consumidores e do capital que os financia. O tema da sustentabilidade continuará a estar na ordem do dia, com uma crescente procura dos consumidores por projetos sustentáveis"
João Cabaça, CEO da VIC Properties

Luís Corrêa de Barros acredita que o setor da promoção imobiliária será afetado também por razões de ordem externa. “As guerras e conflitos atuais têm um impacto no mercado imobiliário motivado pelas inseguranças e incertezas geradas, que vão influenciar o investimento em si e a confiança dos próprios investidores”, analisa, salientando que “o abrandar das duas principais economias europeias, Alemanha e França, poderá gerar um clima de incerteza e de prudência nos investimentos”. Também o resultado das eleições norte-americanas poderá ter consequências, afetando “a posição de alguns investidores que não quererão estar expostos a determinadas incertezas ou inseguranças e que, por sua vez, passem a procurar mercados mais estáveis”. 

Sinais de otimismo… e pessimismo

Gonçalo Cadete, CEO da SOLYD Property Developers, traça um cenário mais otimista, “apontando para a consolidação e crescimento sustentável” de um setor que “continuará a desempenhar um papel fundamental na resposta à habitação”. E diz que a empresa mantém o compromisso de “proporcionar às famílias e às comunidades uma melhoria contínua da qualidade de vida a longo prazo”.

Do lado da Vanguard Properties, o CEO José Cardoso Botelho lembra que é importante separar o trigo do joio: “Para o setor onde atuamos, residencial e hospitality e nos segmentos mais elevados, premium e de luxo, acreditamos que 2025 será de crescimento. Nos demais, dúvidas subsistem devido ao aumento do custo da construção e da mão de obra, margens baixas, juros ainda algo elevados e contração no crédito, bem como ainda falta de clareza sobre o licenciamento. Por sua vez, as dúvidas sobre a taxa de IVA, ora inviabiliza ora atrasará o arranque de novas obras”. 

"Não estamos a enfrentar os problemas de forma assertiva, continuamos a ‘empurrá-los’ com a barriga, sem se resolver as questões de fundo. Continuamos a ter o Estado como ‘principal acionista’ de todas as operações imobiliárias, a ficar com uma fatia de 40% do preço final de toda e qualquer habitação nova"
David Carreira, Country Manager da Thomas & Piron Portugal

Menos otimista está David Carreira, Country Manager da Thomas & Piron Portugal, para quem as alterações legislativas que o Governo tem anunciado terão pouco efeito. “Não estamos a enfrentar os problemas de forma assertiva, continuamos a ‘empurrá-los’ com a barriga, sem se resolver as questões de fundo. Continuamos a ter o Estado como ‘principal acionista’ de todas as operações imobiliárias, a ficar com uma fatia de 40% do preço final de toda e qualquer habitação nova – entre taxas e taxinhas, IVA’s, IMI’s, IMT’s, etc.”. E apoia-se em números: “Por cada 100.000 euros de custo de uma habitação nova, 40.000 vão para o Estado. É insustentável”. 

Lei dos solos trará mais casas ao mercado?
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Haverá mais casas no mercado à “boleia” da nova lei dos solos?

“Olhando em particular para a oferta de habitação nova, não acredito que, em 2025, se registe um aumento suficiente para fazer face à crescente procura que se tem vindo a observar, tanto de portugueses como estrangeiros, o que contribuirá, naturalmente, para a manutenção da tendência de valorização dos imóveis nestas regiões”, antecipa João Cabaça. Ou seja, a oferta tenderá a manter-se “insuficiente para satisfazer as necessidades habitacionais, sobretudo nas grandes áreas urbanas”. 

Sobre a nova lei dos solos, o CEO da VIC Properties reitera que “é fundamental aumentar os perímetros urbanos e identificar novas zonas para construção”, o que “implica a revisão dos PDM, que em grande parte dos casos estão obsoletos e desfasados da realidade”. Mas será esta medida suficiente para resolver o tema da habitação em Portugal por completo? “Claramente que não”, responde. 

Luís Corrêa de Barros lamenta (também) o elevado IVA na construção (não dedutível e a 23%) em Portugal. Uma mudança a este nível seria, “a par com as alterações legislativas que preveem a simplificação dos processos de licenciamentos e aprovações camarárias (Simplex), possibilitar a construção de imóveis a preços que visem colmatar as enormes carências que as famílias portuguesas sofrem”, afirma. 

Relativamente à nova lei dos solos, “poderá ter um impacto significativo no mercado residencial, não só por poder facilitar os processos de licenciamento e aprovação de novos projetos, como contribuindo para a criação de mais habitação acessível em determinadas zonas urbanas”, refere. 

Construção nova? É preciso ir mais longe nas medidas

Antecipando que 2025 “poderá trazer um aumento da oferta de casas ao mercado, fruto de um esforço conjunto entre promotores, investidores e políticas públicas que visam responder à crescente procura habitacional”, Gonçalo Cadete sublinha que a SOLYD “está comprometida em continuar a contribuir para essa oferta, com foco nas localizações estratégicas de Loures, Miraflores e Alta de Lisboa”.  

Sobre a nova lei dos solos, considera que qualquer medida que tenha como objetivo modernizar e agilizar processos será benéfica, “contribuindo de forma positiva para o aumento da habitação”.

"2025 poderá trazer um aumento da oferta de casas ao mercado, fruto de um esforço conjunto entre promotores, investidores e políticas públicas que visam responder à crescente procura habitacional"
Gonçalo Cadete, CEO da SOLYD Property Developers

Para José Cardoso Botelho, CEO da Vanguard Properties, a oferta de habitação não deverá registar um aumento significativo face a anos anteriores. “A procura deverá permanecer elevada, continuando a superar a oferta, o que manterá a pressão sobre os preços”, diz, sustentando que a nova lei dos solos é uma medida positiva. Mas “terá de ser acompanhada com outras, nomeadamente como incentivos fiscais (IVA de 6%)”, avisa. “Para que a legislação tenha um impacto efetivo, será fundamental assegurar a colaboração com os municípios, simplificar os processos burocráticos e implementar incentivos fiscais que atraiam investidores para o setor imobiliário”.

Sem rodeios, David Carreira mostra-se pouco confiante com a chegada ao mercado de mais casas. E lamenta o facto de não estarem a ser tomadas medidas que ajudem a impulsionar o setor: “Ou assumimos, de uma vez por todas, que existe um problema e que todos fazemos parte da solução, ou mudar leis, só por mudar, não adiantará grande coisa. Não podemos continuar a tratar tão mal o investimento imobiliário, seja ele nacional ou estrangeiro”. 

Dando como exemplo os projetos da Thomas & Piron em Portugal (Conde de Lima, Gaia Hills, Docks e Clarissas), o Country Manager da promotora abre o jogo: “Desde o momento da aquisição dos terrenos até à completa conclusão dos mesmos terão decorrido, na melhor das hipóteses, 14 anos (de 2018 a 2032). Terão sido 14 anos para desenvolver e construir cerca de 980 apartamentos, sendo que, em média, 50% do tempo foi ‘gasto’ no licenciamento das operações”.

No que diz respeito à nova lei dos solos, que agora entrará em vigor, o melhor é “esperar para ver”. “Dadas as mais recentes reações de diversas associações ligadas ao setor, parece-nos que mais uma vez se legislou à margem dos agentes e dos principais intervenientes do setor, ou seja, sem que estes tenham sido ouvidos”, lamenta.

Casas de luxo e para a classe média
Créditos: Freepik | Gonçalo Lopes/idealista/news

Luxo Vs casas que os portugueses possam comprar: e agora?

O segmento residencial em Portugal parece andar a duas velocidades, com o nicho de mercado ‘premium’ a respirar confiança e o segmento da classe média em crise, havendo pouca oferta e, entre a existente, a preços elevados para a generalidade dos portugueses. Será mesmo assim? Será que continua a haver espaço para os dois "mundos" conviveram em harmonia?  

“Continuará a haver espaço para os dois mercados, mas com desafios e oportunidades distintas”, indica o CEO da VIC Properties. “Se, por um lado, o segmento de luxo vai continuar a crescer, com investidores e compradores estrangeiros a impulsionar o mercado, por outro, as casas a preços mais acessíveis vão depender também da implementação de políticas que tornem a habitação mais convidativa ao bolso dos portugueses, evitando que o mercado se concentre excessivamente no luxo”, acrescenta.

"São mercados distintos, com métricas de funcionamento totalmente distintas. Não concorrem um com o outro”
Luís Corrêa de Barros, CEO da Habitat Invest

Em jeito de conclusão, João Cabaça considera que “tem de existir uma combinação de vários fatores”. A saber:

  • Revisão em baixa da elevada carga fiscal;
  • Acelerar significativo dos processos de licenciamento, que encarecem consideravelmente o preço da construção final e a sustentabilidade financeira dos projetos;
  • Haver estabilidade legislativa que dê segurança aos investidores que apostam em segmentos que não o luxo.

“Não são ‘dois mundos’, são duas realidades distintas, mas com muitas semelhanças entre si”, comenta David Carreira, lembrando que, tal como acontece em qualquer parte do mundo, os dois nichos podem conviver. O Country Manager da Thomas & Piron Portugal enumera as semelhanças existentes em termos de custos:  

  • A mão de obra para construir, no luxo ou nas casas ditas acessíveis, é a mesma;
  • Os materiais de base para construir, no luxo ou nas casas ditas acessíveis, são os mesmos;
  • As taxas e ‘taxinhas’ a pagar pelos licenciamentos, quer se trate de luxo ou de casas ditas acessíveis, são as mesmas;
  • O tempo para licenciar uma determinada operação urbanística, quer se trate de luxo ou de casas ditas acessíveis, é o mesmo, ou seja, o custo que daí advém (juros de capital imobilizado desde a aquisição dos terrenos) é o mesmo nos dois casos;
  • O grau de exigência (e bem) “ecológico” e de sustentabilidade das novas construções, quer se trate de luxo ou de casas ditas acessíveis, é o mesmo;

O que é diferente em termos de custos, assume, é o grau dos acabamentos e as ‘amenities’ incluídas num e noutro casos, bem como o preço dos terrenos, quer estejamos no centro urbano ou na periferia ou, quer se trate de terrenos já urbanizados ou urbanizáveis.

“Mercados distintos” que não concorrem entre si 

Luís Corrêa de Barros enaltece, também, o facto de serem “mercados distintos, com métricas de funcionamento totalmente distintas”, ou seja, “não concorrem um com o outro”, havendo espaço para ambos.

“No primeiro grupo luxo/premium só uma minoria estará em condições de adquirir este tipo de habitações, que se destinam a clientes com maior capacidade financeira, normalmente estrangeiros e um número reduzido de portugueses. Já no segundo grupo entendemos que se refere a casas que um grande número de portugueses possa adquirir. [Neste caso] O problema não está do lado da procura, reside na enorme falta de oferta”, constata o CEO da Habitat Invest.

Uma visão de certa forma partilhada por Gonçalo Cadete. “Acreditamos que o mercado imobiliário nacional tem capacidade para responder ao segmento de luxo, que atrai investimento e dinamiza a economia, como ao segmento médio, que é essencial para mitigar as necessidades habitacionais das famílias portuguesas”, explica o CEO da SOLYD Property Developers.

"Sem a implementação de incentivos fiscais atrativos, a simplificação dos processos burocráticos e políticas que promovam a construção de habitação a preços controlados, o segmento de casas destinadas à população em geral corre o risco de permanecer estagnado”
José Cardoso Botelho, CEO da Vanguard Properties

José Cardoso Botelho, CEO da Vanguard Properties, promotora imobiliária mais direcionada para a classe alta, diz não ter dúvidas de que o mercado imobiliário nacional “continuará a apresentar uma divisão clara entre o segmento de habitações de luxo e as casas destinadas à população em geral”. 

“O mercado premium e de luxo deverá manter-se dinâmico, impulsionado sobretudo pela procura internacional e por investidores de elevado poder aquisitivo, atraídos pela qualidade e segurança de vida que o país oferece. Em contraste, o segmento de habitação acessível enfrenta desafios crescentes, como o aumento dos custos de construção, a escassez de terrenos urbanizáveis e a insuficiência de políticas públicas abrangentes, fatores que dificultam o equilíbrio entre a oferta e a procura”, prossegue o especialista. 

Em jeito de alerta, frisa que “sem a implementação de incentivos fiscais atrativos, a simplificação dos processos burocráticos e políticas que promovam a construção de habitação a preços controlados”, o segmento de casas destinadas à população em geral, como lhe chama, “corre o risco de permanecer estagnado”. E “poderão agravar-se as desigualdades no acesso à habitação, comprometendo o desenvolvimento sustentável do setor”, remata.

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