Efeitos da inflação, da subida de juros e da incerteza económica acabaram por se fazer sentir nos negócios e nos preços das casas.
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Venda de casas a cair
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2023 foi um ano de ajustamento do mercado residencial português. Depois de terminar 2022 a registar um recorde de venda de casas e de subida de preços, os efeitos da alta inflação, da subida de juros nos créditos habitação e da incerteza económica acabaram por se fazer sentir em 2023, tanto nos negócios, como nos preços. A venda de habitações no nosso país acabou mesmo por cair em torno dos 20% até setembro, gerando uma desaceleração na subida dos preços das casas ao longo do ano. E este cenário também foi bem visível em vários países europeus e no mundo. Para 2024, o mercado antecipa que esta tendência se vai manter, continuando a registar-se uma correção dos preços das casas na maioria dos países europeus, Portugal incluído.

Casas vendidas em Portugal desce em 2023 na ordem dos 20%

O ano de 2022 terminou em alta para o negócio das casas em Portugal. Nem os elevados preços das habitações, nem a elevada inflação e subida dos juros nos créditos habitação impediram que fossem vendidas 167.900 habitações durante o ano passado, o maior número de sempre registado pelo Instituto Nacional de Estatística (INE). E foram mesmo os portugueses os responsáveis pela maioria das transações, apesar de os estrangeiros também adquirirem cada vez mais imóveis e a preços mais elevados - aliás nunca tiveram um peso tão grande na compra de casas em Portugal como no ano passado.

Mas, embora se tenha registado um recorde, a reta final de 2022 já anunciava um abrandamento na compra de casas, sobretudo, pelos portugueses. E logo nos primeiros três meses deste ano confirmou-se o que já antecipava o mercado: a perda de poder de compra por via da inflação, os elevados custos do crédito habitação e a falta de confiança no mercado imobiliário acabou mesmo por impactar a venda de casas em Portugal, tendo caído na ordem dos 21%, com a Grande Lisboa a registar a queda mais expressiva (28%) e o valor mínimo de vendas desde 2016.

Esta tendência confirmou-se nos dois trimestres seguintes, com o verão de 2023 a terminar com uma queda de quase 19% nas transações de casas no nosso país (34.256 habitações, que mobilizaram quase 7,1 mil milhões de euros, menos 12,2% em termos homólogos). Os maiores recuos na venda de casas foram registados no Algarve e na Grande Lisboa, tal como revelam os dados mais recentes do INE.

Compra de casas está a mudar com subida de juros e inflação

Procura de casas para comprar em Portugal
Foto de George Milton no Pexels

Neste contexto de incerteza perante o futuro e elevado custo de vida, a procura de casa pelos portugueses foi-se adaptando em 2023, com as famílias de classe média de olho em casas mais baratas, mais pequenas e até em terrenos. Além disso, também foi reforçada a tendência de procurar casas nas zonas periféricas das grandes cidades, como Lisboa e o Porto, onde os preços são mais baixos (muito embora tendam a subir por efeito contágio).

Já no mercado residencial de luxo, os impactos do atual contexto macroeconómico não se fizeram sentir da mesma forma, uma vez que nem toda a classe alta recorre a financiamento bancário para comprar casa, não sentido o aumento dos juros. Mas verificou-se que as mudanças ao nível legislativo colocadas pelo Mais Habitação – que entrou em vigor no passado dia 7 de outubro – acabaram por aumentar a incerteza entre os investidores ricos, sobretudo os estrangeiros.

Isto porque o Mais Habitação acabou com o programa vistos gold para investimento imobiliário, traduzindo-se, num primeiro momento, numa maior ponderação na hora de comprar casa e até em alguma retração na venda de imóveis por parte dos investidores quem vêm de fora. Mas, agora, verifica-se que os compradores estrangeiros continuam a comprar casas no nosso país – sobretudo os norte-americanos –, sugerindo que os vistos gold não é, afinal, a sua principal motivação.

Também os estrangeiros que querem passar a viver em Portugal vão ver o regime de residentes não habituais (RNH) a terminar em 2024 - apesar de haver um período de transição para quem já esteja a planear a sua vinda ainda este ano -, tendo sido substituído por outro mais restrito: o incentivo fiscal à investigação científica e inovação. Muito embora esta medida tenha levantado os ânimos no mercado, até agora os estrangeiros continuam a ter interesse em morar em Portugal, sendo, sobretudo, atraídos pela qualidade de vida, bom clima, segurança e ainda bons serviços de saúde e educação.

Preços das casas em Portugal estão a abrandar em 2023

A verdade é a procura de casas para comprar, embora tenha caído nos primeiros seis meses de 2023, acabou por ser compensada pela chegada de estrangeiros, continuando, assim, a ser muito superior à oferta de casas à venda no mercado. E é principalmente este desequilíbrio que está por detrás dos elevados preços das casas em Portugal, que continuam a subir, embora a menor velocidade. Também os custos de construir casas novas sobem mês após mês, influenciando os preços.

Apesar de os preços das casas vendidas terem dado o maior salto de sempre em 2022 (+12,6%), segundo o INE, verificou-se que subida dos preços começou a desacelerar na reta final de 2022, mesmo nos municípios mais populosos. E a tendência continuou ao longo de 2023 à medida que as vendas arrefeceram, embora não de forma homogénea em todo o país.

Muito embora os preços das casas à venda tenham estabilizado durante quatro meses (de julho e outubro), uma análise em termos anuais revela que comprar casa em Portugal ficou 5,3% mais caro em 2023, de acordo com os dados mais recentes do idealista. Com esta subida, o preço mediano das habitações situa-se agora nos 2.561 euros por metro quadrado (euros/m2).

Este cenário cria desafios aos portugueses. Com os preços das casas a subir mais que os salários há vários anos, os elevados juros nos empréstimos e a perda de poder de compra, o acesso à habitação está a deteriorar-se ainda mais, levando mesmo um estudo a considerar que Portugal é o terceiro país no mundo onde é mais difícil comprar casa.

Há países na UE que estão a ver os preços das casas a cair

Preço das casas a descer
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Em vários países da União Europeia (UE) também se sentiu os efeitos da inflação e dos juros altos nos negócios imobiliários. Logo em 2022, verificou-se que a venda de casas caiu em 10 países europeus, com a Dinamarca a registar a maior descida (-31,6%), seguida da Finlândia, Holanda e Luxemburgo. E também vários países sentiram uma forte desaceleração na venda de casas durante o ano passado, como a Irlanda, Espanha e Portugal.

Uma vez mais, a tendência de queda no negócios residenciais seguiu caminho em 2023 provocando mesmo uma descida dos preços das casas em vários países. Logo no primeiro trimestre de 2023, os preços das casas na UE recuaram 0,7% face aos três trimestres anteriores e na Zona Euro desceram 0,9%. E verificou-se que os preços das habitações diminuíram em 11 dos 27 Estados-membros da UE, com Luxemburgo, Alemanha e Finlândia a registar as maiores quedas.

O mesmo se passou no segundo trimestre de 2023: os preços das casas para comprar caíram 1,1% na UE e 1,7% na área euro face ao mesmo período do ano anterior, sendo mesmo a primeira diminuição anual desde 2014. Em concreto, contabilizaram-se 9 países europeus que registaram descidas homólogas dos preços, como a Alemanha, Dinamarca e a Suécia. Já em 17 países, os preços das casas continuaram a subir (alguns a menor ritmo), Portugal incluído.

Esta tendência de descida ou abrandamento dos preços das casas é também sentida um pouco por todo o mundo. Por exemplo, do outro lado do Atlântico, nos EUA, verificou-se que a evolução dos preços das casas ocorreu a menor velocidade. Este facto está intimamente ligado aos elevados custos de financiamento e da inflação, que acabaram por reduzir o poder de compra das famílias e arrefecer a venda de imóveis.

Quais são as perspetivas de evolução dos preços para 2024?

Preço das casas em 2024
Foto de Startup Stock Photos no Pexels

Embora já se esteja a assistir a um ajustamento dos preços das casas em 2023, tal como se antecipava, a Comissão Europeia (CE) alertou recentemente que há muitos mercados residenciais na Europa que continuam sobrevalorizados, como é o caso de Portugal. E estes casos apresentam mesmo o risco de uma “futura correção mais acentuada” nos preços das casas, se as condições económicas se deteriorarem, avisa Bruxelas.

E não é a única entidade a deixar este alerta: também o Banco de Portugal admitiu que, no nosso país “a probabilidade de uma correção de preços no mercado imobiliário residencial tende a aumentar”, num contexto marcado pelas tensões geopolíticas na Ucrânia e no Médio Oriente, incerteza quanto à duração da restritividade da política monetária do Banco Central Europeu e deterioração das perspetivas económicas. Mas o regulador liderado por Mário Centeno admitiu que a escassa oferta de casas deverá mitigar o impacto da redução da procura sobre os preços das casas no nosso país.

Ainda assim, há quem faça as suas previsões para o futuro. O Bankinter estima que os preços das casas em Portugal deverão descer 2% em 2024 e em 2025, devido “à perda de atratividade desta classe de ativos para os investidores com a entrada em vigor do novo regulamento da habitação, o Mais Habitação”. Também o CaixaBank admite que os preços podem descer 2,1% no próximo ano.

Já a agência de notação financeira S&P vai mais longe antecipando uma descida de 8% nos preços das casas em Portugal no próximo ano, admitindo que esta vai ser a tendência na maioria dos países da UE, com a Alemanha, Reino Unido e a Suécia a registarem quedas na ordem dos 10%.

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