
A turbulência geopolítica e económica foi-se acumulando desde o estalar da pandemia, e desafiou a dinâmica do setor imobiliário comercial em 2023. As correntes cruzadas criaram alguma volatilidade, mas não faltaram oportunidades de investimento. Mais cautelosos e seletivos, os investidores procuraram diversificar portfólios como estratégia, direcionando a liquidez para segmentos alternativos, que devem continuar a ganhar destaque nas suas preferências.
Em 2023, os problemas do setor imobiliário comercial - face à quebra de preços e estagnação da atividade em muitos países – voltaram a trazer à tona a importância de olhar para a economia global na hora de investir. Ainda assim, o Mecanismo Europeu de Estabilidade (MEE) veio serenar os ânimos, dizendo que os “riscos parecem menos sistémicos do que no passado”, estando os bancos mais bem preparados para enfrentar as pressões.
Apesar disso, Portugal não passou ileso a esta crise. 2023 foi marcado pela concretização de transações de pequena e média dimensão e pela cautela dos investidores, devido à incerteza no âmbito internacional. A tendência de quebra é transversal aos principais mercados europeus. O volume transacionado em ativos de imobiliário comercial deverá situar-se, por isso, entre os 1.800 e 2.000 milhões em 2023, numa redução de 45% face a 2022, segundo os especialistas. Alternativos, logística e turismo mantiveram-se resilientes, com os escritórios a enfrentarem maiores dificuldades.
Mas as perspetivas para o próximo ano mais otimistas. E já se fazem apostas para o que aí vem: a atividade de investimento imobiliário a nível global deverá aumentar e voltar a uma rota de crescimento. E Portugal continua a aparecer na lista de destinos mais procurados em 2024.
Segmentos alternativos: a força das residências de estudantes
Apesar de um ano mais difícil, as oportunidades continuaram a surgir, nomeadamente em setores alternativos, como os de ‘healthcare e living’, que incluem ativos como residências seniores ou residências de estudantes. Segundo os especialistas, estes são segmentos que evidenciam uma progressiva tendência de consolidação no mercado nacional e que se apresentam com potencial de crescimento, já que estão associados a ativos com contratos de maturidades longas e uma estável rentabilidade.

A dinâmica das residências de estudantes é inegável, numa altura em que o país se debate com uma enorme falta de alojamento estudantil. Faltam pelo menos 46.000 camas em Lisboa e no Porto, numa altura em que o stock existente e os novos projetos planeados continuam a não ser suficientes para suprir a procura:
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Hotelaria mexe e atrai negócio
Quando se fala de turismo, Portugal aparece no top de destinos favoritos. O setor continua a ser visto como uma “galinha dos ovos de ouro” e, à boleia deste dinamismo, a hotelaria mexe e atrai negócio. A meio do ano saía a notícia que apresentava Portugal como o quarto país da Europa com mais projetos hoteleiros em construção. Serão, pelo menos, mais 130 hotéis nos num horizonte temporal de um ano, segundo um relatório da consultora Lodging Econometrics (LE).

Trata-se de um segmento que movimenta milhões e as perspetivas seguem em alta. Até setembro de 2023, o investimento em hotelaria em Portugal mostrou a sua resiliência: foi concluída a venda de 10 hotéis com um investimento superior a 400 milhões de euros, mais 23% do que no mesmo período do ano passado. E foi mesmo a venda dos hotéis Dom Pedro ao grupo Arrow Global que representou a maior operação hoteleira do ano. As previsões para o fecho de 2023 apontam para um investimento na hotelaria de 680 milhões de euros. Contas fechadas, só no próximo ano.
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Logística é oportunidade: falta (muita) oferta
A oferta de espaços logísticos novos e de qualidade é escassa no espaço europeu. E Portugal não é exceção. Ainda assim, há uma confiança generalizada pelos vários ‘stakeholders’ e ocupantes com intenção de aumentar a sua área logística. A Merlin, por exemplo, espera reforçar a sua aposta em logística na Península Ibérica, num investimento que deverá rondar os 340 milhões de euros.
O setor manteve-se resiliente e 2023 foi marcado por vários negócios. Destaca-se, por exemplo, o negócio da Montepino, sociedade de investimento imobiliário especializada no setor logístico, promovida pela Valfondo e pelo Bankinter, quw está a avançar na construção daquele que será o maior projeto logístico em Portugal, em Castanheira do Ribatejo. A socimi prevê um investimento superior a 120 milhões de euros na construção do projeto chave na mão da Leroy Merlin no lote 1, que tem uma área bruta de construção de 108.000 m2.
Mas há outros negócios que vale a pena recordar:
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Percebe-se, também, a presença cada vez maior da tecnologia, bem como a importância dada aos fatores ESG no setor da logística. Segundo especialistas citados no European Real Estate Logistics Census, "estamos a assistir aos avanços tecnológicos que continuam a impulsionar a evolução da cadeia de abastecimento, com os ocupantes a investirem numa gama diversificada de tecnologias, incluindo veículos elétricos e automação, à medida que procuram ganhos de eficiência e produtividade, juntamente com um melhor desempenho em termos de emissões de carbono”.

Retração no mercado de escritórios
Contenção continua a ser a palavra de ordem no mercado de escritórios português em 2023, uma tendência alinhada com o contexto internacional. Desde janeiro até outubro, foram ocupados 79.300 m2 de escritórios em Lisboa e 45.290 m2 no Porto, refletindo uma queda de 69% na capital e de 8% na cidade Invicta face ao período homólogo.
Sentiu-se ao longo do ano uma retração da atividade, quer no mercado de Lisboa, quer no Porto, refletindo-se numa perda de volume de absorção e negócios. Ainda assim, o mercado não tem dúvidas de que existe um interesse contínuo por espaços de qualidade. A capital portuguesa, por exemplo, está entre as cidades europeias mais atrativas para 'flex offices'
Apesar das dificuldades, continua a ser uma classe de ativos atrativa para os investidores pela segurança dos contratos e estabilidade do rendimento.
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